Três poemas de Dércio Braúna

 

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Joel Neto

 

 

 

 

O ETERNO QUE NÃO POSSO

 

O nascimento de teu mundo

não cabe nesta engenharia de meu uso.

Ainda que te escreva com minha magia,

a luz com que te digo não pode o eterno

que desejaria eu, teu escrevente;

não pode o tamanho do sonho

que embalas

nestes velhos alicerces do mundo.

 

Esta magia que sei,

ó carne-irmã da minha,

é feito cisco no desluzir da tarde –

mal pode haver

e é tempo de já não ser.

 

Mas que importa?:

a vida é enquanto.

 [in Escrevivências: livro de vidas imaginografadas]

 

 

 

Oráculo

 

a poesia não está na palavra

(como uma coisa em si)

mas no olho de quem vê

o que lhe carrega o nome

[in A selvagem língua do coração das coisas]

 

 

 

DOS PEDAÇOS DE MADEIRA DE DEUS

 

I.

Principio meu mundo

com os restos de madeira de teu deus –

talho minha lira

da humanidade

desse já quase-húmus.

 

Gosto de sonhar o impossível

pelo possível dos pedaços.

 

II.

Nada é belo

que não carregue em si

os restos da própria nascença:

uma pobre morte particular

para um dia sem ênfase –

 

em que talvez um violino

console um pássaro só.

[in Metal sem húmus]

 

 

 

 

DÉRCIO BRAÚNA [1979] é cearense, de Limoeiro do Norte. É bancário e historiador (mestre e atualmente doutorando em história social), com estudos sobre as relações entre história e literatura.  É autor de obras poéticas (O pensador do jardim dos ossos A selvagem língua do coração das; Metal sem Húmus; Aridez lavrada pela carne disto; Como cavalos fatigados abrindo um mar; Escrevivências); contos (Como um cão que sonha a noite só) e estudos historiográficos (Uma nação entre dois mundos; Nyumba-Kaya; A assombração da história).

 

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