Três poemas de João Bosquo

MARCOS VERGUEIRO 300x199 - Três poemas de João Bosquo

Marcos Vergueiro

 

 

 

Antigo Mar Chacororé

Aqui na Baía de Chacororé, antigo mar,
havia – do tempo de ter – um peixe sabido
e fugia dos anzóis e tarrafas traçadas

Ele ensinava – que a vida é ensinar –
os lambaris e outros peixes menores
como se safar das armadilhas do destino
impostas pelo próprio rio Pantanal…

Esse peixe sabido sempre nadava
rio abaixo com as próprias nadadeiras
sem jamais sonhar rio acima ou asas

No trecho de ir e vir – nascer e morrer
em águas velhas ou renovadas águas –
o peixe sábio, filho, pai e avô de peixes,
não se deixa levar pela soberba do saber.

 

 

 

Café do Ano Novo

Estou aqui. Bebi o café quente do ano novo,
lembrei-me de pessoas e dum livro de poemas lidos
quando queria ficar triste, mas alegre permaneci
olhando para fora da janela do próprio tempo

Contar o tempo quando se vê no espelho do banheiro,
ao fazer barba de pelos brancos, é obrigação diária
sem se exaltar, sem desespero, sem indignação vária

Estou aqui, neste mesmo recinto que me verá
quiçá, centenas de anos, procurando palavras
nesta inglória luta com a linguagem materna
entre o sentir e o papel em branco de poesia…

Este meu recinto, sinto, precisa de limpeza interna:
menos egoísmo, mais compaixão e decisão na busca
pra superar o Pantanal desta minha humanidade.

 

 

 

Bom Dia de Fernando Pessoa

Fernando Pessoa diz: bom dia!
Em um poema de alta periculosidade
Sem medo de ser identificado
Como poeta português

Tudo que podemos somar
Dois e dois, remar rio abaixo
Descer às profundezas do Pantanal
Vem da herança lusitana…

Bom dia! Responde o leitor
De outro lado do continente
E sorridente olha para fora

Da órbita terrestre e vê o dia
Que se agiganta como um sol
E brilha infinito como uma estrela.

 

 

 

João Bosquo, poeta, jornalista e licenciado em Letras/UFMT, mora e trabalha em Cuiabá. Como jornalista atuou nos jornais O Estado de Mato Grosso, A Gazeta (Cuiabá), em 2001 editou o semanário A Notícia (de Cáceres); presidente do Sindicato dos Jornalistas (1995-1998) e desde 2002 trabalha como assessor de imprensa, até janeiro de 2015, como repórter da Secom/MT. Atualmente é repórter freelance e coordena o site poetasdemt.cuiaba.br
Morou em Curitiba, onde publicou o livro Abaixo-Assinado (1977) em parceria com Luiz Edson Fachin. Em Cuiabá novamente, os livros Sinais Antigos (1981), Outros Poemas (1984), Sonho de Menino é Piraputanga no Anzol (2006) e Imitações de Soneto (2015).
Participou das antologias Abertura (1976), Panorama da Atual Poesia Cuiabana (1986), A Nova Poesia de Mato Grosso (1986) e Primeira Antologia dos Poetas Livres nas Praças Cuiabanas (2005); com Abdiel ‘Bidi’ Pinheiro Duarte editou o alternativo NAMARRA (1984/86) e coordenou o projeto POETAS VIVOS (1987/88), da Casa da Cultura de Cuiabá.

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This Article Has 2 Comments
  1. Marília Beatriz Reply

    Lindos poemas, mostrando a força dos signos em suas emoções telúricas e nas memórias

    • Marília Beatriz Reply

      Lindos poemas, mostrando a força dos signos em suas emoções telúricas e nas memórias

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