Três poemas de Jefferson Dias

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Monty Python

 

 

QUANDO EU ERIJO OS DIAS
 
Quando eu erijo os dias as noites os meses –
As mãos –
Um peito arde
Por baixo e o peixe enraizado
Rompe
O gelo fino de um crânio
Feminino,
(Cabelos de açougue,
Dentes de cometa estéril.)
 
Quando eu morro
Nos ossos do texto
(Mercado dos cabelos,
Mármore dos dentes demarcados)
Uma voz incinera os lábios
E espalha
A
Manteiga quente
Nos livros altos.
 
Meu corpo enfurecido
 
Endurece no meio do sonho:
 
Despenha no sangue prostrado das frutas,
No canibalismo entre polvos.
(Bancos de areia estelar.)
 

 

 

VIGÍLIA
morte era
Tudo,
A respiração entrava
Alta no luar, osso redondo dilacerando
O lugar, demônio inexorável –
E esquecíamos.
Voz ancestral dos ônibus,
(Ablução metálica ou tautologia elétrica)
E íamos com a cabeça de diamante
Contra a madeira (a maciez do sono).
Uma coroa batia a sombra
E as formas no centro truculentamente
Paradas
Queriam arremedar a vida,
Queriam deitar fora
A vida.
Osso redondo entrando na noite,
Grácil osso cartográfico,
Arauto do dia, tigre ou espectro,
E esquecíamos, com o azinhavre da cabeça.
Porque
O corpo refulgia e tudo era um corpo.
A respiração entrava alta, lua no altar,
Tuas mãos saíam lépidas. As minhas mãos.
Vidro reumatismal no colo. Dificílimo descrever
A arquitetura da vigília, estearina das pálpebras.
Nossas mãos
Paradas. Nossas vozes cruas no animal.
A vida era tudo.
 

 

CEFALÓPODE
 
(Não houve a aniquilação das páginas do espanto.)
Passei
Pela colina dos teus lábios ensombrando por fora
As cartas, as orquídeas, a velhice:
Pura água nos espaços ardendo fundo ou artérias paradisíacas.
Então uma esfera de mênstruo e sal
Em Marte assim,
Um café nas tubas uterinas da noite.
E escrevi –
Rasguei uma nota demasiadamente pessoal:
Um oceano morreu no teu sexo.
Sei-o eu, teu texto.
 
De repente o cefalópode.
 
Quando sorvi a pérola das tuas pálpebras,
Quando cosi teu sangue, quando cozi teu nome,
Já era o tempo da imorredoura alquimia:
Tangerina áspera nas mãos apartadas.

 

 

Jefferson Dias (nascido em Monte Sião – MG; vive e trabalha em Ribeirão Preto – SP). Formou-se em Letras pela Universidade Federal de São Carlos. Seu trabalho de conclusão de curso consistiu em uma monografia acerca da montagem, empreendida pelo poeta Herberto Helder, do poema “Húmus” a partir do texto homônimo de Raul Brandão.
Poeta e prosador, publicou o livro de poemas Último festim (editora Multifoco, 2013); em 2014 teve o poema “Dédalo” publicado na segunda edição da revista “euOnça” (editora Medita). Em 2015 veio a lume seu segundo livro de poesia, Silenciosa maneira, que integra a Coleção Galo Branco da editora Medita (mediante o edital nº 34/2014 do Programa de Ação Cultural “Concurso de apoio a projetos de publicação de livros – coleção de obras inéditas no estado de São Paulo”). Escreveu, ademais, Qualquer lugar (poesia, inédito), Sonata do Diabo (romance, inédito). Atualmente apronta um livro de contos, ainda sem título, e trabalha na tradução do poema Briggflatts, de Basil Bunting.

 

 

 

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