Um castiçal para iluminar o fosso da memória, por Jean Narciso Bispo Moura

Um castiçal para iluminar o fosso da memória, por Jean Narciso Bispo Moura

 

LuizOtavioOliani Foto 192x300 - Um castiçal  para iluminar o fosso da memória, por Jean Narciso Bispo Moura

Luiz Otávio Oliani, 2017, A persistência da memória, RG Editores

 

 

XX

frente à finitude 

os cemitérios guardam 

segredos incontidos

dores não reveladas

Pág. 32

 

 

   Luiz Otávio Oliani, autor do livro “A persistência da memória (RG Editores, 2017), título homônimo de uma das pinturas de Salvador Dali, parece elaborar um inventário à porta da galeria do tempo: a obra tem como motor principal a ideia de transitoriedade. Há na poesia dele uma escolta diligente e indagadora, de símbolos de nossa efemeridade. O tempo manifesta-se no olhar do poeta como um panta rei, de Heráclito,  pois tudo passa, nada permanece, as coisas e as pessoas realizam em sua poética um movimento reflexivo.

Oliani, neste livro aproxima-se do  imanente, sem recusar a transcendência, os dois polos não apresentam explicação conclusiva: o olhar aparentemente agnóstico esta presente em sua obra.

O poeta vê na arte um paliativo  para angústias existenciais frente à morte –  ela, na sua visão, é uma fonte capaz de trazer alívio contra a irreversível finitude humana.

 O espírito contido na obra de Dalí, mitiga o sentimento de subtração e perda.  O tempo é, como diz  o autor, um devorador que produz em nós um estado pleno de ausências.

O ontem entra rapidamente em prescrição, o  nosso hoje é sempre uma narrativa póstuma: 24 horas depois. O hoje é um ente que não poderá  no dia seguinte ser apalpado em seu estado original. O tempo é como um rio, assim nos ensinou um famoso mestre pré-socrático.

 A partir do momento que o animal rationale  se destacou cognitivamente dos  demais  seres inteligentes,   transformou o luto e a sabida ausência completa de si em algo muito pesaroso.

A obra de arte deste modo sedia na mente humana um estado de êxtase,  o apreciador ao consumir os símbolos pincelados contenta-se  à primeira vista com  a aparentemente e indecifrável  irradiação gerada pelo sensível ato contemplativo.

 

só os dedos de Salvador Dali

perenizaram o nada

pág.17

 

O autor traz consigo um castiçal  para iluminar o fosso da memória, pondo um suave bálsamo  em nosso processo de finitude.

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