Três poemas de Antonio Aílton

AILTON ESBOÇO 224x300 - Três poemas de Antonio Aílton

 

 

O TROCO

(sensibilizado por um poema de Jandira Zanchi)

 

 

encho o meu carrinho de alimentos perecíveis

e livros virtuais que guardarei plastificados

como posfácio

lembro do Mesmo na casca semântica deste dia

cinza

não quero ser identificado pelas etiquetas

mas aí está a minha cesta de escolhas escassas

e poucas metáforas

para o poema que devo dedicar à caixa do supermercado

devo falar em linguagem simbólica ou cifrada

para não ofendê-la

ela vai rir como uma etiqueta, ela vai dar meu troco

incerto

e nada digo

 

não posso deixar a vida ainda mais parca

por questão de centavos

não quero parecer o machão, o poeta ou o panaca

consolo-me com a lembrança de um poema de Jandira Zanchi

tiros na esquina

 

mas continuo sem saber como reagir ao assalto

sequer se devo reagir ou apenas seguir em frente

preparo-me para fazer outra leitura

dos tiros na esquina

vou me deslocando sem estacionamentos

com medo de perder sem dar o troco

topo com um cara similar

mas não sei se eu sou o produto verdadeiro

um de nós deve restituir a vida do outro

deve haver algum acordo, alguma coisa a ser

simplesmente

dita

antes que entremos

em pânico

 

 

II

Entra ano, sai ano

de farelo em farelo

 

de bagana em bagana

entre o chão

 

e

dois metros do chão

 

entre a borboleta

e Bispo do Rosário

 

Quem faz uma lenda urbana

para o pardalzinho?

 

 

Chegas do teu longo passeio de anos

enquanto emagreço entre pedras e marés

chocando o futuro da espera

 

Mas um coração calejado é um coração pronto

para quando o retorno acontece

trazendo quem sabe alvoroço

 

e iluminação

 

Agora, asperge o gelo

escorre teu cabelo

e sobe

 

 

 

 

*[ANTONIO AÍLTON]: poeta, professor, pesquisador da poesia brasileira contemporânea. Livros publicados: Compulsão agridoce (Poesia, Paco Editorial, 2015); Os dias perambulados & outros tOrtos girassóis (2008, Prêmio “Cidade do Recife” – Categoria Poesia);  As Habitações do Minotauro (2001, Prêmio Cidade de São Luís – Poesia) e Humanologia do eterno empenhoconflito e movimento trágicos em A Travessia do Ródano, de Nauro Machado (2003, Prêmio Cidade de São Luís, ensaio). Autor da tese MARTELO E FLOR: Horizontes da forma e da experiência na poesia brasileira contemporânea (Curso de Teoria Literária, Universidade Federal de Pernambuco).

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This Article Has 4 Comments
  1. Anna Reply

    Eu gostei muito destes versos de Antonio Ailton. Derramam vida e citidiano com uma linguagem supreendente . Lerei mais, sou aprendiz , gosto de me inspirar nos bons.

  2. ANTONIO AÍLTON SANTOS SILVA Reply

    Minha gratidão ao Jean Narciso e demais editores deste site pela preciosa divulgação de minha poesia (a qual, neste caso, se o autor não é exatamente inédito – embora carregue o peso do anonimato – os poemas o são. Grato também ao parceiro e poeta Carvalho Júnior pela indicação.Fico feliz com mais esse canal, feito por poetas/artistas verdadeiros para a divulgação da poesia. Vida longa ao Literatura&Fechadura!

  3. ANTONIO AÍLTON SANTOS SILVA Reply

    Minha gratidão ao Jean Narciso e demais editores deste site, pela divulgação da minha poesia. Mesmo que o autor [eu] não seja exatamente inédito (apesar de carregar o peso do anonimato), os poemas o são. Meu agradecimento também à indicação pelo poeta e parceiro/irmão Carvalho Júnior. Vida longa ao Literatura&Fechadura!

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