Sinal Verde
Se não for o tigre em chamas de William Blake, ou dançarino do fogo, se não é o inferno, o crime em série do santo ofício, se não for o apocalipse há de ser a multidão apenas, debelada no lábio do semáforo.
Hora Extra
Há dez mil horas do ocaso. Nenhuma asa. A luminária é o diamante da escuridão. Relevo nenhum de telhado, nenhuma brisa que enerve o plantão da calçada sem passos. A bola de papel jogada ao chão não ousa perturbar o mundo – a treva pinta bocas de platina pela rua anestesiada, engole mãos, talheres e teclados, mortos que parecem vivos.
Lenda da Terra de Marlboro
Não faz muito tempo, em todo outdoor, no rosto maquiado de toda esquina, fácil vê-lo. Eu só reparava o laço em seu punho, nem via seu rebanho de búfalos negros. Teria lá seus trinta, trinta e poucos anos. Nada me dizia sua bocaentreaberta, baforando a nuvem espiral. Como o cheiro agreste queusasse, nada, nada mesmo me dizia.
Ele era um caubói. Eu seguia na multidão. Eu nem reparava o seu cavalo majestoso, em todo outdoor, no rosto maquiado de toda esquina. Fumar faz mal à saúde: não era lei escrever. Por ele, eu passava reto. Foi excesso de alcatrão? Teria lá seus trinta, trinta e poucos. Eu nem reparava a embalagem vermelha, sangue de búfalos negros. Eu seguia – foi carcinoma?
Rosana Piccolo – Poeta paulistana, autora dos livros Ruelas Profanas (Nankin, 1999), Meio-Fio (Iluminuras, 2003), Sopro de Vitrines (Alameda, 2010), Refrão da Fuligem (Patuá, 2013) e Bocas de Lobo (Patuá, 2015). Em 2017, publicou a plaquete O Pão, pela Lumme Editor.
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Amo, de verdade, o que diz esta poeta