Três poemas de Amanda Vital

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antigênese

no princípio era a morte
em ruínas estáticas de esgotamento
a desintegração em tecido único
um não-espelhamento em ponto cego
o breu exalando seu odor rançoso
à falta de caminhos possíveis

em seguida veio o verbo
a mão que se ergue no aglomerado
convocando a luz o reinício do pulso
desamassar ao convexo a face composta
fazer das cinzas seu sustenido etéreo
gerar da queda o ímpeto reverso.

 

 

a cigarra não canta a própria morte

a cigarra não canta a própria morte
ela vocifera, urge, ralha e brada
em agudos polifônicos dispersados
ao primeiro sinal de nuvem negra

mas não canta a própria morte

ela anuncia o arrancar da própria tez
ovacionando a nueza às semelhantes
prolificando-se em ciclos axiomáticos

mas não canta a própria morte

ela se espalha entre toras e troncos
pisa na terra, equilibra-se em galhos
voa tardes que lhe resumem a vida
numa inconsciência pura e indolor

e isso é estar bem longe da morte

 

 

apetite

basta o desgastante falar das maturações
do tempo do verbo que nunca se alcança

tez algodoada de um azul inquebrantável
onde a palavra é lúcida e a poesia é mansa

que o fruto ainda verde caia sobre as mãos
em um só sentido, uníssono e irreversível
desfazendo-se em grãos ao puir nos dentes

e confronte a etérea solombra atmosférica
com toda a força desgarrada das urgências
interrompendo o tempo sacro da semente

bendita seja a palavra daquilo que se consome
bendita a rebelião do lado de dentro da fome

 

 

Amanda Vital (Ipatinga/MG, 1995) cursa Letras com ênfase em Estudos Literários na UFMG, em Belo Horizonte, transferida da UFPB. Publicou seu primeiro livro, “Lux”, pela Editora Penalux, em 2015. Entre 2014 e 2016, participou do grupo de declamação Aedos. Posta seus poemas nos blogs “Amanda Vital Poesia” e “Zona da Palavra”, e também produz videopoemas experimentais no Youtube. É colaboradora no conselho editorial da revista Mallarmargens.

www.mallarmargens.com.br

 

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This Article Has 2 Comments
  1. Gilberto Sorbini Reply

    Caramba! Gostei muito de seus poemas. Tem umas metáforas ali simplesmente sensacionais. Quero ler mais.

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