LIVRO DE POESIA “RETRATOS IMATERIAIS” PÕE A LÓGICA PARA OPERAR SEGUNDO OS NOVELOS DA POÉTICA
por Fernando Andrade
A força da palavra não está às vezes no que ela significa. Num sentido quase filosófico. Cadeira. Todos sabemos que é um assento. Deixar o corpo baixar para uma posição confortável de descanso. Muitas vezes, a palavra quando agrupada na escola, num movimento de socialização ela perde um pouco seu sentido por deslocar sua importância na estética. O sentido ainda permanece mas com o filtro do som, de uma musicalidade operante que laça o que é ao que parece perante uma palavra colega, (poética).
Por isso é tão importante um senso de coletividade na audição. Ouvir para um poeta é a máxima filosofia de juntar uma relação entre o que a cadeira pode e sua grafia/música oferece para coletivizar. Bons poetas não fazem força para expandir relações. Eles mantêm uma coesão no trabalho lapidar de dizer com poucas palavras dentro de um poema utilizando um repertório de vocábulos para surtir um efeito de potência estética no verso.
É o caso do belo poeta Jean Narciso Bispo Moura, em seu novo livro “Retratos Imateriais”, pela Editora Singularidade. O mundo, das relações humanas, são categorias, muitas vezes ou quase sempre regidas por leis sociais. Vivemos numa espécie de prisão social, e é certo que o seja assim. Mas a arte não seria um forma de bagunçar? Pôr tudo de cabeça para baixo uma lógica que serve para ordenar e manter uma certa organização? Para Jean em seu livro, tudo, desde a natureza até relações sociais, pode operar num outro ritmo.
Loucura
mas se eu virar
de cabeça para baixo
tu serás meu céu
pena que ficarei molhado.
E por deslocar a visão do olhar, por posicionar a câmera num tripé não natural ou concreto, por surrealizar as trocas entre a mão que oferece o aperto e que recebe, Jean cria novas relações que não são passíveis de serem fantásticas. Não, Elas apenas tem uma nova ordem interna, que é da poética. E há no poeta uma fabulação do próprio manejo do poema, como se ele estivesse operando tanto no sentido à criar tanto na condição criativa do poema, mostrando ao leitor, os fios e laços que puxam uma aliteração no verso, por exemplo.
Há uma relação entre a neve e o que se pode fabular, nela. Crianças gostam muito de mover enredos na neve. Fazer uma cinemática de personagens com seus bonecos de neve. A fabulação de uma página em branco, também é um evento que relaciona ou operacionaliza uma construção de como é uma mancha textual? Qual será seu caráter enquanto produtora de sentido? Jean olha o personagem a ser criado de forma a não questionar um status. Talvez sua feição (ou compleição) seja de sugestionar traços, linhas que não fecham círculos ou centros. Sua poesia não fecha sentido.
Fernando Andrade, 50 anos, é jornalista, poeta, e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemoemetria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Está lançando esta semana o quarto livro de poemas, a perpetuação da espécie pela Editora Penalux.
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