nova sina
as rugas de sua fronte
e os dedos em riste
são rios
carregam histórias
margens ribeiras
barrancos tortos
sustentam comboios de linhas
carretéis de esperança
contêm horizontes
os calos de suas mãos
montanhas de esquecimentos
sombras de morte
dúvidas
lábios
gritam terras cavadas
covas abertas
a sonhar sementes
e chuvas serôdias
colheitas escondem-se em seus lombos
e seus olhos
seus olhos discorrem dores
carregam o pó da estrada
e militam a própria vida
há de ser que um dia
a vida valha a pena
e de si a pena componha nova sina
ladainhas
as mulheres que conheci amamentavam
e tinham peitos secos
e olhar de água de poço
e coração de atabaque
cordas de viola
as mulheres da minha infância
não sonhavam
supriam
andavam devagar
peregrinavam procissões inteiras
e terços de joelhos
conheciam ladainhas de cor e salteado
a boca era relho
treinado para adestrar filhos
as mulheres que me apresentaram
desde cedo sofriam
corcundas de histórias mal contadas
carregavam fardos centenários
e se conformavam com as marcas nas costas
e bebiam veneno se preciso
as mulheres da minha história
apresentaram-me ruínas
assim me construí
aqueles olhos
eu jurara não me perder em labirintos azuis
escuridão há muito que não enfrentava
os fundos de poço
os doces castanhais
deixara presos em laços de fita
em algum lugar adolescente
andava devagar
usava pijama de algodão de bolinhas
descalçava-me de afetos
e arrastava as horas
nos tons pastéis das alpargatas
despia-me cordialmente
conformada
diante do espelho trincado nas laterais
a desfrutar a calma das pradarias mornas
primaveris ou outonais
(equivalências não se particularizam)
costumo dormir de portas abertas
não sou boa com fechaduras e cadeados
meus pés livres
rejeitam tornozeleiras
e dourados penduricalhos
tudo em ordem em minha volta
habito o caos alimentado
as sinfonias e suores guardava-os para ocasião
sim
eu sonhava
e os azuis que sempre evitara
invadiram-me a casa
aqueles olhos de gelo e fogo
em mim estenderam tendas
amarraram cordas
firmaram estacas
construíram-se abrigo
tornei-me alcova
morada
as tempestades de verão nunca mais me abandonaram
Ivy Menon, advogada, pós graduada em Filosofia e Teoria do Direito, Bel. em Teologia, é poeta e nasceu em Cornélio Procópio, o Norte Velho do Paraná. Boia-fria até os 20 anos, Ivy, ainda pequena aprendeu a amar os livros e os bancos da biblioteca. Depois de sair da roça, trabalhou em O Diário do Norte do Paraná, em Maringá. Hoje, aposentada da Justiça do Trabalho, mora na zona rural de Rio Negro-PR.
Em 4 de dezembro de 2006, venceu o I Concurso Carioca de poesia promovido pela Associação Brasileira Cultural de Apoio à Cidadania (Abraci) que contou com as parcerias da Academia Brasileira de Letras (ABL), Como prêmio, teve publicado seu primeiro – e único – livro de poesia, “Flores Amarelas”, lançado, no Rio de Janeiro, no dia 30 de abril de 2007. Ocupou a Cadeira nr. 31 da Academia de Letras de Maringá.
Este ano, foi uma das finalistas do Prêmio OF FLIP, na categoria Poesia.
Um privilégio estar aqui. Obrigada!
Encantada e maravilhada com esses poemas!!!!
Realmente impressionante os poemas da Ive. Para serem lidos repetidas vezes, com olhos livres. Interessante também a sua história. Queria saber mais detalhes. Gostaria muito de ter o contato dela para encaminhar meu ESPÓLIO. Demais saber que uma poeta tão enorme estivesse a ler meu livro.