“o mar dentro de ti, Sol” – Três poemas de Marcelo Ariel

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DE VLADIMIR MAIAKOVSKI NO INSTANTE DE SUA MORTE

É possível matar o Sol
a própria vida não consegue viver
Perfeito é tudo
que em morte
se transforma

É possível matar a chuva
e o poderoso oceano
É possível assassinar o tempo,
o céu, cancelar.
Companheiros, a própria morte
pode morrer

Ouçam o que o fogo
e a cinza querem dizer
Não se chama vida
algo que não faz
a morte morrer.
Da minha parte,
venho defender
da farsa do entendimento
a fúria nobre
que alimenta
o triunfo de um fracassso.

Morte, meus irmãos
é o nome do silêncio
estelar, ouça Iessênin
este nó de fumaça
é maior do que os
séculos
Não, ele me disse, é apenas
o pó da luz dançando com
o ar.
Para onde ele vai
o amor é possível

Também desejo estar
neste lugar
que palavra alguma
pode tocar

Em algum lugar fora da
vida, a vida vive
cessa a figuração e tem
vez a transfiguração

o mar dentro de ti, Sol
pode parar de respirar
tantas imagens gastas

Nossa alma tudo quer
atravessar

simplesmente ser
em algum lugar

parece que apenas
fora da vida, se
alcança o viver
sem o pretexto da
esperança

Acaso pode sem o pretexto
da utopia, a ilusão
deixar de ser colhida nos
campos da antivida

Suprema alegria
sentir a morte na
própria carne
morrer
para que a poesia
possa viver.

 

 

JOÃO GILBERTO OU COMO SAIR DO TEMPO

Não, não havia a compreensão
de que todas as canções são maneiras
de não apenas parar o tempo,
mas de sair dele,
para uma segunda dobra do espaço
onde respira o vazio perfeito
criador de todas as harmonias impossíveis

Não, não havia a compreensão
de que a canção
é nossa única saída

No lugar da compreensão
havia a selvageria etérea
a selvageria etérea da canção

vêm dos sonhos
ou do Sol
a sensação
de que você
está flutuando
enquanto canta

vêm dos sonhos
ou do Sol
esse tremor

 

 

ENTRE A BELEZA E A VERDADE, PREFIRA A BELEZA

Porque ela morre,
a verdade
sem jamais
ter nascido,
a beleza
tendo nascido
jamais cessa
seu caminhar
até o sonho
e depois volta
para a natureza
habitando
sem saber
o esconderijo
da harmonia,
e quando nossos
ossos
como chaves
abandonadas para sempre
de esquecidas portas
brilham no escuro
a verdade
ignorando
a si mesma
os confunde
com uma bússola
para o lugar sem portas,

se uma formiga
com sua delicadeza
voraz
atravessa
as galerias
do que será pó
com uma ínfima
partícula
do que foi nossa carne,
a beleza
segue com ela
para além da verdade.

poemas do livro OU O SILÊNCIO CONTÍNUO POESIA REUNIDA 2007-2017 no prelo pela Kotter/Patuá

 

Marcelo Ariel é poeta, pensador e performer, nasceu em Santos em 1968 , vive entre São Paulo e Cubatão. Autor dos livros TRATADO DOS ANJOS AFOGADOS, COM O DAIMON NO CONTRAFLUXO, A NÉVOA DENTRO DA NUVEM entre outros.

 

www.mallarmargens.com.br www.revistamododeusar.blogspot.com

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