Por FERNANDO ANDRADE
.O fato ou a assombração dizia meu tio quando pegava um violão pra modo de tocar uma toada caipira. É certo que ele via que certo compasso da melodia à ser tocada com dedos grossos de fazer fumo era um pouco próximo do trote de um certo pangaré que ele usava para correr atrás de bois. Ali, nos campos das Gerais não havia este troço de gênero, era tudo junto e misturado, as meninas da família adoravam pegar cavalos e subir uma serra no lombo do animal, ficar perto da fogueira contando caso e ouvindo mote de assombração. São estes casos, que muitas vezes são as histórias que os trovadores aqueles que ouvem pelas estradas narrativas e vão recontando à moda sua, aumentando um tiquinho com recursos de fábulas, cabendo ou não a velha moral embutida feito fumo retinto de mito. Estes casos foram compilados pela voz da cantora Inezita Barroso que inventariou o espaço de “dentro” deste pais que tem muita terra ou estrada de terra com botina. A cantora e compositora, Ceumar, e os músicos Lui Coimbra e Paulo freire fizeram um belo tributo, Viola Perfumosa, às canções de Inezita. Lui Coimbra, um dos responsáveis do projeto, toca violão, rabeca, violoncelo, e Paulo Freire, voz, viola caipira e causos. Na maioria das vezes são narrativas cujo teor de encantamento\fantasia vem embutido pela descrição de um lugar, um sertão da primeira faixa, onde o narrador descreve o que lhe faz bem ao situar na sua memória, uma travessia afetiva. Por onde andou, pelo que afetou o espaço de um lugar rememorado pela poética da luz da lembrança como um baú de guardados onde o proseador retira versos e melodias. A brincadeira ou auto-olhar sobre si, não afeta então vieses sobre demarcações de gêneros, pois como na letra da música moda de pinga, uma mulher pode ter quase um caso de amor com a bebida a danada pinga e não ser recriminada pelo suposto “maus modos”.
A brincadeira ou auto-olhar sobre si, não afeta então vieses sobre demarcações de gêneros, pois como na letra da música moda de pinga, uma mulher pode ter quase um caso de amor com a bebida a danada pinga e não ser recriminada pelo suposto “maus modos”. A brincadeira é um recurso do bom caipira que entra no gingado do próprio corpo da própria noção de identidade, que nunca é coesa, mas sim, espalhafatosa com um fato bebido pelo mais trevoso caso de fantasmasia. Ceumar brilha toando cada cantiga com sua voz doce e melodiosa e estabelece com Lui Coimbra e Paulo Freire uma valorosa conversa ao pé do ouvido, numa (con)versa de bate pronto entre quem nasceu em qual mês trocando “alfinetadas! na canção Horóscopo. O sotaque caipira da trinca é impagável neste faixa.
Fernando Andrade é jornalista, poeta e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemometria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Lançou em 2018, o seu quarto livro de poemas A perpetuação da espécie pela Editora Penalux.
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