Fernando Andrade entrevista o músico e compositor Cacá Machado

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FERNANDO ANDRADE –  Seu álbum tem uma questão interessante do movimento associado à mudança. Como foi falar desta questão de mudança no disco?

CACÁ MACHADO – Interessante a sua percepção. Acho que tem sim o movimento em vários estágios: a voz do morto que canta em “dança”; o encontro transformador em “Tremor essencial”; a melancolia da separação em “Olha”. De fato não tinha pensado nisso sob a perspectiva da mudança. Mas faz todo sentido. Acho até em “sob neblina” aparece uma mudança, ou um desejo de movimento, numa situação de certo imobilismo criado pela visão turva da neblina. Mas no fundo tudo é desejo de mudança mesmo.

 

FERNANDO ANDRADE – Na terceira faixa Tremor essencial, há um jogo de imagens muito interessantes sobre a terra, a questão do chão, manter os pés no chão? Há parece um exercício de acabar com certa paralisia, que não gera reflexão. Há palavras na letra que geram um exercício de fricção, gerando faíscas para pôr as coisas em movimento? Fale um pouco desta letra em questão?

CACÁ MACHADO – Esta letra foi escrita em conjunto com um amigo muito querido chamado André Stolaski e Celso Sim. São camadas que friccionadas geram a explosão do tremor essencial de Eu, você, nós dois… É um encontro explosivo mas que é contado de modo detalhado. O tremor essencial vem da terra, é um abalo sísmico. Força incontrolável. Mas que precisa do silêncio, por isso: “fremem em silêncio total”. Algo que como do silêncio do universo viesse a explosão do tremor essencial: o “bing bang” do grande amor.

 

FERNANDO ANDRADE – Não há uma linha estética muito definida nas melodias. Você varia bem cada melodia para as canções. Como foi pensar cada concepção sonora para cada faixa?

CACÁ MACHADO – Para mim tudo gira em torno da relação da letra e da composição. A partir disso penso as camadas do arranjo. Em Sibilina eu quiz centralizar a sonoridade nos clarinetes processados com pedais, sons synths em contraponto ao meu violão acústico e a bateria livre de Antonio Loureiro. Gil Monte, que produziu comigo o disco, trouxe camadas com guitarras e ajustou minha voz para a massa sonora que vinha se formando. Mas cada núcleo de canção é uma unidade em si própria que tem que comunicar a sua razão de ser. Talvez por isso que você sinta as variações das “melodias”. Por outro lado, acho que a instrumentação deu uma liga estética para o disco como um todo. Muitos sopros, percussões (batuques) e tonalidades escuras com as guitarras e synths. Esta foi minha intenção. 

 

FERNANDO ANDRADE – “Debaixo desta terra não me interessa o movimento, debaixo do cimento não tenho pressa não há quem queira dançar”. Esta faixa fala do corpo não como fonte do imobilismo, mas como agente de ação, acima da terra, como corpo produtor de transformações. Fale um pouco disso.

CACÁ MACHADO – Exato. O corpo como força libertadora para a vida. Mesmo o cantor defunto caiu na dança e partir deste movimento se transforma e pode transformar o mundo. Por isso o tempo: “Daria minha vida/ A quem me desse o tempo”. A morte é o fim do tempo. Mas este defunto cantor tenta ressuscitar pela dança. Ou seja, pelo tempo.

LINK foto: https://pt.wikipedia.org/wiki/Cac%C3%A1_Machado

 

FERNANDO ANDRADE é jornalista, poeta e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemometria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Lançou em 2018, o seu quarto livro de poemas A perpetuação da espécie pela Editora Penalux.

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