Novela A suicida de sexta-feira é uma ótima leitura do descalabro da educação no interior do Brasil.

 

por Fernando Andrade

É como se cada membro da família saísse porta à fora não para pertencer ao mundo, esta vasta referência do lado de fora que não está dentro ou guardado dentro do coração do homem. Talvez as lembranças forcem um tipo de degredo, algo, sem nome, sem função identitária. Embora qualquer personagem real ou ficcional deva trabalhar a memória, não fazê-la contaminada – contaminação.

Sim, um dia se parte do universo familiar, cria-se laços duradouros ou não. Mas é como se a pasta tanto do ponto de vista da mistura disforme de um alimento, como uma espécie de organização sobre uma categoria, tanto da escola, como de uma empresa, este sentido de postular e ordenar perante outros, sendo parte do contexto e afetação ao mesmo tempo: de um afeto ao grupo ao coletivo.

Na novela, a suicida de sexta-feira do escritor T.R. Kneip pela editora Penalux, o autor numa voz ao mesmo tempo atenta e sóbria, cujo som dela soa límpida e crítica ao mesmo tempo, venha do personagem-narrador, professor Josué, que tirou primeiro lugar num concurso público para uma escola numa cidade chama Curral dos Pássaros. O magistério aqui parte não só do conceito de aprendizagem de um conteúdo escolar, mas passa, por um filtro, de olhar sobre a escola enquanto lugar não só de ensino, mas de consciência crítica sobre a função que ela tem numa organização que saia do esquadro da prática, onde deveria ser apenas função pedagógica, acaba se envolvendo relações políticas, nomeações e acochambramentos.

É interessante que o professor sinta parte de um coletivo incluindo colegas professores, diretores de escolas, pedagogia escolar. Kneip não isola seu personagem numa ostra classista de profissão, onde a intervenção da fala para a melhora do ensino, é tachada pelos acomodados, muitas vezes num discurso chamado de progressista. Como se o professor tivesse que ser um tipo de programador de dados, incluído numa tabela Excel. Nada disso!
Fora da tabela, ele é uma consciência alerta. Josué alinha em sua argumentação toda uma prática política de sucateamento da educação, em municípios pouco visualizados pela opinião pública, onde cargos políticos são defenestrações ao “bom uso da máquina do lugar” quanto à gestão das verbas para escola. Como bom “argumento” de que é preciso gerir bem o espaço escolar para aquela ideia bem brasileira adequada ao jeitinho brasileiro de que não se pode desperdiçar nem material humano aqui uma ironia negra bem brasileira onde uma funcionária fica em coma, e quando volta ao trabalho, não é reintegrada ao quadro funcional. Assim se desvia verbas superfaturadas que não eram bem assim… ficando apenas um esqueleto da obra em planilha, como exemplo, o banheiro da escola.

A cidade às vezes fica maior que o própria noção de posição ou ocupação da pessoa à coletividade. As relações sociais passam à ser medidas pela influência que nomes de famílias têm na naquele contexto social, apadrinhamentos, nepotismos. Josué é uma peça que querem fora do quebra-cabeças que é curral dos pássaros. Ele foi classificado em primeiro lugar, mas há simulações, subterfúgios, para lhe tirarem a vaga merecida. Interessante notar, que Kneip use uma voz narrativa sendo altamente funcional, pois a visão do narrador não só é inteiramente elucidativa, como chama o leitor a identificação com imbróglio que secretários de educação dotam o cotidiano da cidade.

cotação: ótimo

 

 

afernandoab 150x150 - Novela A suicida de sexta-feira é uma ótima leitura do descalabro da educação no interior do Brasil.Fernando Andrade crítico literário, escritor, poeta, autor de 4 (quatro) livros de poesia.  Autor de Perpetuação da espécie, [Penalux, 2018.]

 

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