por Fernando Andrade
A dor que se torna crônica não deve ser do mêtier do cronista. Não há reflexo mais agudo que a dor; sua sina é quase como um farol em alto-mar guiando rotas de lombalgia que muitas vezes é pior que a tempestade mais esporrenta. O cronista deve fugir da dor… a não ser que se meça poeta ou compositor e recite ou receite a dor Elegante do quase linguista Leminski.
Por que digo isso? a crônica é o reino da miscelânea; do concretismo sincrético, aquela sinapse doida que não tem endereço nem referência, muito de acordo com as emoções do momento, ou seu humor da hora. Muitos cronistas preferem um assunto para dissecar como se enfezasse com o tema e o perseguisse até o beco mais escuro com aquele farol ou lanterna que guia o bom cronista.
Tem outros que preferem condimentar o conteúdo com temas afins ou correlatos criando relações entre fatos afetos e fotos. Gosto mais deste último, pois nele, há uma liberdade de brincar com a língua, com os sinais, a grande massa de códigos que a vida humana sobre a terra nos oferece. Athos Ronaldo, autor do livro Sofrendo em Paris, Editora Penalux é este segundo exemplo de cronista que adora cair dentro do tema e se esparramar pelo entorno, não importando se da Geometria vai aludir o gol do Inter no Beira-rio numa parábola perfeita de estética matemática.
Se cada crônica olha seu plot por um ângulo, Athos faz de seu repertório de causos, um triângulo amoroso de relações causais que ele experimentou ou não, e de uma micro-série de ficções-experimentadas sobre o reportar. Aquilo que foi lido por Athos e reprocessado por sua lente, claro, uma lente identitariamente gaúcha, com aquele humor de zomba que num trocadilho meu … não ria. A parada é séria, embora às vezes cômica, como ele sofrendo em Paris, sem dinheiro no bolso, Belchior meu querido, você já foi à Paris? para se esbarrar em quem mais que não à Carla Bruni. Crônicas que falam de um encontro, de um olhar à vista no primeiro esbarrão com uma mulher bonita.
Há os que tem eco no apocalipse como um asteróíde que colidirá com a terra. Aqui o alquimista se faz presente e parte com bola e tudo para o jogo lúdico com referências entre objetos e coisas-datas, como também uma vacância com a proximidade da língua; mexer com a lógica do sentido. Athos muito irrequieto, não é de ser monotemático nem monocromático, sua agilidade verbal e de raciocínio faz com que ele mantenha um foco, um centro, mas como bom tergiversador ai, falei nela de novo, ele íngreme marchas diferentes em temas e contornos.
Fernando Andrade – crítico de literatura, poeta e escritor, autor de 4 livros, o mais recente Perpetuação da espécie [ Penalux, 2018]
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