Livro de contos Amor passageiro tensiona as relações nem sempre causais do afeto pelo outro

A geometria do amor não seria coisa para maestros nem um mote de maestria. Calvino em seu livro de contos Amores Difíceis, não chegou a tirar a raiz quadrada de uma relação amorosa, mas através de sua lente sempre potencial: a literatura era para ele, um campo de possibilidades infinitas, ora matemáticas, Cidades invisíveis, ora filosóficas como seu outro livro, Palomar. Ele analiticamente prescrutava o humano diante do jogo combinatório da troca relacional, como se chega ao outro? um lance de dados? ou um lance de xadrez?

Para um amor um tanto custoso aqui não temos balanço para monetarizar nada, mas aquela posição de levante – levar à diante uma situação boa ou ruim?

Lendo o novo livro do escritor Menalton Braff, Amor Passageiro, editora Reformatório, puxei o gatilho da memória para tantos livros que amaciavam esta questão tanto de cunho literário de chegar no livro, pois ele também é um objeto do desejo, e assim está passível, de tropeções, pecadilhos, embaraços de leitura e livro. Aqui faço uma laço não de fita, de afeto, que Menalton escreve com o espelho retrovisor poético, aquela relação entre miasmas do passado-presente ainda colados um ao outro, que nada são que uma relação experiencial com o outro pelo tempo. E sim, basta, olhar para uma pequena greta, onde se deixam ações esquecidas ainda sim, agentes de porvires que vemos seus personagens tateando afetos ou sinalizações de eventos possíveis ou prováveis. Como no conto que abre o livro, o personagem numa estação de ônibus. Não sabemos que ação vindoura vingará nele, mas para àquela posição de espera ou não, há uma afecção latente, quente.

É interessante correlacionar a relação de espaço quase geométrica onde se dá as possibilidades de olhar, enlaces de progressão do afeto rumo ao conhecimento do outro. Como no conto que dá título ao livro, que lembrei muito do autor italiano, pois penso eu, ter ele colocado temas afins também num trem, com a mesma equação afetante entre personagens: o movimento de avanço ou recuo num espaço fechado, onde só se tem a janela como escape.

Um conto que me chamou bastante atenção, pelo seu cunho de simbologia geracional, O último domingo de outubro. Ali, uma tensão pairando na narrativa, com um movimento de paridade – identificação entre filho e pai, mas a narrativa parece caminhar para um espesso negrume de degredo. O pai sai por um chamado que parece tão irreal quanto insólito.
Raymond Carver já nos brindou com que pode acontecer num conto sobre pescaria, onde numa bolha aparentemente idílica, poderá explodir volições espasmódicas.

cotação: excelente

 

 

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Fernando Andrade – poeta, escritor e crítico de literatura, autor de 4 livros de poesia. A sua obra mais recente é Perpetuação da espécie [Editora Penalux, 2018]

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