Caio Riter é escritor, professor, mestre e doutor em Literatura Brasileira pela UFRGS. Atualmente cursa Pós-Doutorado em escrita criativa na PUCRS. Possui vários livros publicados. Com alguns, recebeu prêmios importantes como 1º Barco a Vapor, AGEs Livro do Ano, Açorianos, Orígenes Lessa, além de algumas referências internacionais, como Catálogo de Bolonha e o White Ravens.
Rato
A palavra rato
pelos não tem,
mas rói por dentro,
desarticula o pensamento.
A rata palavra
não é santa, inexata,
geme, guincha, estertora,
rasura o papel do agora.
O rato da palavra
invade mineral labirinto,
rateia pelos cantos, é desvio,
eco em espelho sombrio.
A palavra rato e eu,
dois e três, todos e um,
roedores em tantas lavras,
eu, o rato e as palavras.
(poema inédito)
Homem de cinza
O sol invade as nuvens,
o vento move folhas na calçada,
uma flor desabrocha no jardim,
um pássaro no chão traz quebrada sua asa.
E o homem de cinza espreita na esquina de minha casa.
Uma vizinha alimenta pombas,
outra varre o lixo da madrugada,
um portão bate em despedida,
a água fétida e escura do esgoto vaza.
E o homem de cinza aguarda na esquina de minha casa.
Um mendigo dorme encostado na parede,
um cão sarnento ronda na rua esburacada,
colegiais caminham em silêncio solitário,
um caminhão espirra lama, a poça é rasa.
E o homem de cinza espera na esquina de minha casa.
O homem veste cinza; a esquina é da minha casa,
e o céu se arma,
e a chuva cai,
e as vizinhas se recolhem,
o mendigo, o cão, os colegiais,
pessoas se abrigam espremidas na parada,
e o homem de cinza segue firme, estático, imóvel,
estátua atenta na esquina de minha casa.
Não sabe, o homem, que estrelas vermelhas possuem asas.
(Publicado no livro “Os saberes da água”, editora Artes & Ecos, 2019)
Canino
Meu cão é feito de quereres,
seu canto abre a fenda da alvorada;
meu cão é feito sentimento,
seus dedos desenham pão e água;
meu cão é feito roçar de alma,
sua palavra inaugura poesia.
Meu cão se faz no próprio fazer-se,
não tem pelos, não tem penas, apenas plumas.
Meu cão desentende Cabral.
(Publicado no livro “Os saberes da água”, editora Artes & Ecos, 2019)
A forma da água. É um bom filme. A minha dúvida é se o diretor, o roteirista são pós-doutorados…