Ao ler Todos os nós da autora Maria Luiza Maia (Penalux, 2019), nos perguntamos o porque dos ‘nós’, pois sim, que ouso a ter essa resposta. Os nós que todos temos durante nossa jornada, mostram que por vezes eles podem apertar, podem machucar, como também podem soltar e salvar alguém. Diariamente as pessoas dão ‘nós’ ou soltam os ‘nós’ que existem em suas vidas.
Durante a leitura de Todos os nós é possível perceber que a autora reforça alguns nós
para a construção de sua obra. Dona de uma escrita lírica fluida, Maria Luiza Maia se apresenta para nós com seu toque peculiar em seus constantes arranjos, amarrações ou a maneira singular que utiliza em sua escrita conseguindo dar esse “nó” na produção das formas de ser e de estar de cada um. Com isso, criamos nós leitores, nosso universo com nosso particular nó de todos os nós.
Ao ler o poema ‘escrevo aos poetas’, imagino uma roda de samba em uma reunião
particular, num belo jardim, tendo em uma conversa gostosa alguns poetas, que durante o dedilhar da melodia do samba, os poetas dedilham seus pensamentos e apresentam suas obras.
Até me vejo ao lado de Vinicius de Moraes, acompanhado de Carlos Drummond de Andrade, ainda tendo o prazer da companhia de Hilda Hilst, Lya Luft e Chico Buarque.
Na escrita desse poema, a autora descreve os poetas em uma espécie de homenagem, e podemos ver isso nos trechos “resolvi acreditar em todos aqueles poetas/ – os melancólicos/ que sempre disseram que a escrita é um refúgio”, como também em “também coloco minha fé à disposição/ daqueles poetas/ – os outros/ os otimistas”, trazendo uma parte importante em que fala “e diante de tudo isto/ destas crenças construídas de/ última hora aqui dentro/ eu peço a todos eles/ os poetas/ os melancólicos e os otimistas/ que me ensinem a fazer das minhas/ palavras escritas um refúgio”.
Maria Luiza Maia nos mostra que o nó nosso pode se juntar ao nó de outrem, tanto que se juntarmos e rimá-lo, temos a poesia, que junto a uma bela melodia, pode virar canção. Os poetas expõem os nós interiores contidos em cada um, através dos quais, brota uma bela poesia, uma bela canção que fica gravada na memória conforme cada leitura ou quando se ouve a canção. É uma constante mudança, em nosso remendar de sempre.
Em ‘um corpo corre’ me chama a atenção que o nó que temos tão fortemente preso em nós mesmos, se desfaz quando percebemos o que nos aguarda, quando não há mais surpresas, quando não esperamos por mais nada. Vemos isso no trecho “ainda é cedo e me espanto com o vazio da rua/ com o barulho do vento em meus ouvidos/ e o assanhado em meu cabelo/ mas que me avisa que em breve, tão breve/ estarei naquele quarto, do jeito que o deixei:/ quieto, silencioso, me esperando”.
Nesse poema vemos uma cena, como se fosse em um filme se discorrendo diante de
nossos olhos conforme a leitura que é feita. A imaginação projeta em nossa memória a cena dirigida pela poetisa, que parece dirigir a nós leitores para dentro de sua tela. Até parece que vemos a um filme preto e branco, sem sons, assim como fazia Charlie Chaplin. Mas nesse caso, vemos a nós mesmos como protagonista dessa história.
Em outro trecho do poema “me apronto para as madrugadas/ como se fossem eventos/ cheios de pessoas queridas e abraços./ a madrugada é a minha pessoa querida,/ é ela quem me abraça”, parece estarmos nós leitores em um bar, olhando para o céu, quem sabe somos como alguém que caminha na rua e sente a brisa tocas nossa face, ou ainda, podemos simplesmente estar na companhia de amigos, quem sabe solitário, olhando pela janela da sala a noite estrelada.
A noite parece ser uma amiga, uma amante dos poetas.
Outro poema da autora que nos salta aos olhos é ‘carregadas’, nele a autora mostra nossa carga emocional, cultural e tudo o que isso acarreta, seja para uma pessoa do cotidiano em suas atividades diárias, mas principalmente a um poeta, que escolhe expor sentimentos, ideias, seus pensamentos em uma folha de papel, na qual, as pessoas podem ler e absorver tudo ali exposto. Quando lemos “me deixem escrever./ ainda que sejam essas palavras/ tortas sujas simples/ são palavras cheias”, vemos a necessidade em expressar através das palavras o nó que esta preso no peito.
Maria Luiza é uma escritora atenta aos detalhes. Em sua escrita é possível perceber que como na comunicação através da fala, sua escrita nos remete a um mundo de possibilidades e interpretações distintas. Não há um sentido exato, mas sim, o sentido depende tanto de quem escreve, como de quem o lê. Talvez seja por isso eu ouso dizer ser tarefa quase impossível traduzir em palavras uma ação, um sentimento ou um pensamento.
Marcelo Frota é professor e tradutor. Nascido no Rio Grande do Sul em 1979, é apaixonado por cinema, literatura e música e tem apreço especial pelo jazz e pelo blues, sem deixar de lado o rock clássico e a chanson francesa. Considera-se um cinéfilo devoto e apaixonado pelo cinema europeu, americano, latino-americano e brasileiro. No seu coração literário os espaços são ocupados por autores que vão de Shakespeare a Saramago, sem nunca abandonar os romances policiais baratos, a ficção científica e a poesia marginal.
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