FERNANDO ANDRADE
jornalista e crítico de literatura
Um escritor que senta para escrever “acha sua história”, em uma narração ele contará com personagens , enredo, tempo-espaço. Mas o quê? diferiria um escritor de um autor. Apenas que o escritor lida com a estrutura de um romance ou pequenas narrativas breves. O autor seria mais um legado, talvez humanista que o demarca não só para escrita, mas também sob a responsabilidade do ato e, sim, com todos os possíveis desdobramentos civis ou não. Ou diria melhor, suas consequências de mexer através da escrita no mundo-entorno.
O autor se estabelece pela relação entre criar e criaturar, aqui podendo tanto ser um cientista maluco que cria um ser à sua imagem e semelhança. Esta criação ele permeia a consciência humana em todos seus sentidos. Ela pode ser uma partícula de átomo, pode ser a trindade – Espírito Santo, por que está compartilhada no humano na natureza. Uma obra aberta se descontextualiza apenas de um formato como um livro, inclusivamente, fechado, para se coadunar com o universo cambiante onde flutuam, afectos, razões, ações e suas consequências.
Portanto é admirável ver uma obra como o longo poema que aqui quase pode-se se ver desfraldado como uma peça livre de sua encarnadura de papel tipográfico. Mas claro, a obra do mundo também tem autoria, são fractais dos elementos semióticos – poéticos. W. J. Solha numa tessitura quase escalavrada com uma certa teia de fios longos alinha todo num formato de verso livre um poema, Vida Aberta – Tratado poético e filosófico , Editora Penalux, que na sua constituição não importa muito as relações formais entre as partes internas do verso, ou melhor importa, como a musicalidade de rimas internas ou dialógicas vão sofisticar o sentido e estrutura frasal do poema.
O poema como num jogo de referencialidade tanto espacial, como certos rebatimentos entre palavras sonoras rítmicas, como numa intertextualidade com todo repertório cultural e artístico, fraseados cinematográficos, líricas musicais, da literatura de todos os tempos. O processo da lembrança é associativo neste livro, a lembrança é conexa com que está relevante ou em primeiro plano.
A estrutura da vida aberta viria deste tipo de gatilho que a palavra poética faz esculpir um certa noção de tempo, não passado, mas que hibridiza tanto uma bricolagem com a massa de modelar que vai pegando forma , por que o sentido além de ser moldável ao contato da mão do autor, sofre refrações do tempo. O tempo é uma partícula que age no brincar do sentido momento. Solha faz em seu livro uma arquitetura que talvez só os psicanalistas tenham acesso ao consultórios; modelar a partir da palavra atuante, todo um repertório que está ali guardado, na memória, mas que está pronto ao lúdico, ao aspecto da modelagem, sabemos o que é seu uso e tem um aspecto de vestir ou revestir toda uma nomeação conceitual.
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