Livro de poemas “A ordem dos fatores ocultos” mistura a semiologia tanto poética como da arqueologia dos símbolos na arte escrita e iconográfica

 

 

FERNANDO ANDRADE

crítico literário

 

A ficção teria também uma arte figurativa, uma espécie de segunda via da semiologia das palavras através de seus signos e significados. O cinema dinamitou esta questão da iconografia do texto escrito, tanto que para expressar em outra língua que não a língua original do filme utilizou a expressão da chamada legenda, como forma de pontificar esta babel de línguas que o mundo planificou em latitudes e longitudes. Mas a imaginação ainda parece ser a arte figurativa mais avançada do quesito humano. Lida com toda a simbologia dos arquétipos, das redes de potencialização de sentidos, captura de afectos e pulsões que devaneiam o lado ora sombrio ora luminoso da alma humana. E certo que as imagens do sonho, as imagens dos pensamentos trazem ordens cifradas, reflexos do inconsciente.

Se tomarmos a vida de uma pessoa como uma sucessão de experiências, cada imagem produzida entre pensamento e ação; reflete muito de uma iconografia de uma linha tanto temporal como sensorial, pelo que esta pessoa vai retendo de si e dos outros pela veia biográfica. Esta veia biográfica poderia ser uma carta de tarot? onde cada nanossegundo, onde cada partícula de vivência estaria já molecularizada em uma carta-lembrança.

No livro de poemas, A ordem dos fatores ocultos, do músico e poeta Caco Pontes, pela editora Garupa, temos esta divisão tanto do livro como da vida experiencial que parece que plana separada pela mitologia do humano, mas que gruda uma à outra, quando religare quando religada pelo aspecto ritual do sagrado ou até do profano. Há uma conexão entre escrita e a noção oracular de tempo, como algo não só cíclico, mas como também, voltado para uma interioridade onde os sentidos não florescem por si sós. Caco tece em cada seção como Experiência, Visão e Travessia, toda uma arqueologia de sintomas e afectos que demandam estas três marcas do sentir o mundo ou o real, aqui uma gozada, empírico.

Esta conexão do religare com o mundo, o poeta em versos muito imagéticos e sensoriais tece uma liturgia de cada ação reflexiva desta conexão do self com o externo. Aqui o poeta religa todo processo tanto religioso quanto místico, da capacidade do cérebro em gerar entropia e conexões com os sentidos e a catarse do real dito empírico. Esta iconografia tanto simbólica vem travessiada por um espírito de jornada, daquelas que a literatura planificou no estudo do mitos narrativos, como a jornada do herói. A travessia entre mundos que parecem oponentes na verdade pode não passar de uma imagem tanto de processamento cerebral, mas como também, de um pertencimento mais amplo com todas as partículas elementares do universo.

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