O romance “A casa das Aranhas” abre o espaço cênico para as marcações de casa ( ou Gêneros)

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Fernando Andrade
crítico de literatura

 

O faroeste, gênero masculino por opção, tem aquela clássica cena onde a cidade encontra-se deserta. Não há uma viva alma, mas há certo suspense em algum tipo de casualidade entre uma ação e consequente reação sempre violenta. Não sei  o porquê, porém vejo certa atração do gênero por um tabuleiro de xadrez, onde as peças parecem saídas de uma cidade esquecida; um lugar onde talvez só existam depósitos, como uma antiga pensão. Lugares esquecidos de gente que já esqueceram de mover destinos de peças que dialogam ou diagonizam em extremo. Se esquecermos da razão do jogo onde cada movimento parece uma teia para não só ocupar espaços, e o faroeste não seria também isso, uma ocupação de tomadas de poder, tanto do dinheiro roubado quanto de um machismo sobre as mulheres.

Também para destrinchar algum tipo de esquecimento sobre ter a terra e o tempo, pois à medida que avanço deixo  a raiz-solo abandonada.

Se o xadrez é casa e ao mesmo tempo armadilha para o oponente. O que diremos de alguns personagens que habitam um povoado esquecido em alguma fronteira inominável? Onde parece que apenas alguns personagens ficaram numa certa pensão para esperaram a espera de um god ou uma gota de saliva umedecendo o paladar ou palavra que não é a mesma, com tanta secura. A escritora Márcia Barbieri fecha sua trilogia do corpo com a Puta e o Enterro do lobo branco, seguido deste belo A casa das aranhas, editora Reformatório.

Para cada personagem abrindo com Estevão, um servo que me lembrou de uma certa tradição quase medieval, onde ainda não traçava qualquer traço de fidalguia para usar um termo antigo também. E pelo fluxo de consciência que estes personagens vão falar ao leitor, nivelando as ações entre as peças do jogo, em que cada marcação quase como um lugar de cena, têm uma fala-marcação de gênero muito nítida. Na luta de classes entre Estevão e o dono da pousada, o traço não é tanto social, embora podemos traçar relações de estirpe\estigma como no capítulo do psicanalista desprezando o servo ou empregado.

A questão é sobre o dono da fala e a sua linguagem como sinal de nascença, que tem poder de gerir palavras ofensivas à Esther, Estela, de apagar identidades com escárnio e ofensas de amortalhar uma mulher viva, adoentá-la à ponto de acamá-la. É muito interessante que Marcia tenha optado pelo experimento vivo da linguagem do pensamento sem o fluxo do (juízo). O duplo aqui no livro funciona tão diferente para cada gênero; para as personagens de Esther e as outras, sempre um adormecimento em vida.

Não há relações de alteridade, quando chega o psicanalista ao lugar (…) temos a aguda percepção de como o tratamento pela palavra ou escuta ( sic) ressente de uma ressignificação do excesso ou verborragia da teoria sobre o corpo|alma; teremos que sopesar a soberba de um analista que chega numa pensão onde a vida está tão mesmerizada pelo abandono, não seria táctil o mesmo se camuflar ao ambiente. Marcia termina esta trilogia de forma que cada livro aumenta e complementa o outro. Personagens não servem para isolar as casas, aranhas, deambulam sem sentido de fronteiras ou marcações.

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