Trevas
disseram-me
uma vez
quando ainda uma
criança onírica
que podíamos tornar verdade o:
“era uma vez”
disseram-me ainda
que há magia
que podíamos moldá-la
trazê-la às nossa vidas
se assim acreditássemos
mas nunca
nunca
disseram-me que
a magia
tinha duas faces
e sem perceber
a vida
tornou-se mestra do magismo
mas
nos acontecimentos
vejo que ela
não escolheu
castelos
trens
varinhas
ela escolheu
escuridão
e
em consequência
solidão.
Memoriais
Escritores não contam histórias
Músicos não criam melodias
Artistas não retratam vitórias
Poetas não escrevem poesias
Finais não erguem laudatórias
Funerais não despejam cortesias
Coveiros enterram suas glórias
O que resiste para ser lembrado?
Memórias.
Os pés aristocratas
Antecede o amanhecer do espreguiçar dos outros membros
Põe-se à macular os refinados lençóis
Levanta-se
Sustenta um grande peso já pelo alvorecer
Veste-se de linho confortante contra a frigidez da manhã
Protege-se do mármore acarpetado
Vai ao banheiro
Fica nu
Entra primeiro na água quente da banheira
Descansa os músculos e esquece tudo
Por fim, veste-se de graxa preta brilhante
Toma café na cozinha
Saí para um dia de trabalho árduo
Pensa em ir a rua
Mas prefere pilotar os pedais de grande luxo
Que encontram-se na garagem impecável
Junto com outros sete
Chega ao trabalho já cansado de dirigir
Senta-se à mesa e põe-se em cima de um banquinho de mogno
E por lá fica
Remexendo-se e remexendo-se no ar
Entediado
No almoço, levanta-se
Vai ao restaurante com toda a força que possui
Volta ao trabalho acabado e machucado por atravessar a rua enfeitado com meias
de seda
No fim do expediente
Um par vassalo usa o carro para levá-lo para casa tamanho o seu cansaço
Chega finalmente a porta da frente do apartamento no último andar
Tira os sapatos
Tira a meia
Fica nu
Toma banho
Descansa
E a noite
Deita-se no colchão de água
Sobre um travesseiro de plumas importado
E cai adormecido os pés mortos de cansaço
Ah, como sofrem de exaustão!
Após um longo dia
De trabalho aristocrata.
Gustavo H Araújo, nascido na cidade de São Paulo, onde reside atualmente, 19 anos, é estudante de Design e técnico em Comunicação Visual. Desenha, ilustra e escreve contos, poemas e resenhas sobre arte. E-mail: gustavoh.adsaraujo@gmail.com
Be the first to comment