Doutor em Ciências da Educação (Universidade do Minho). Autor dos livros de poemas A Travessia das Eras (Penalux, 2018) e Depois do Sonho (Penalux, 2020) e do livro O Coronelismo na Literatura: Espaços de Poder (UFRB, 2018). Coautor do livro Redescobrir-se: poesias de fim de século (Selo Editorial Letras da Bahia, 1998) e do livro Crítico Intrépido! Filósofo Tímido? Sílvio Romero e o ensino secundário de Filosofia no Brasil (CRV, 2018). Associado ao NALAP – Núcleo de Artes e Letras de Portugal e membro da Associação Nacional de Escritores (Brasil) e da Academia Independente de Letras (Brasil).
OUTROS CICLOS
Pedra.
Além dos cíclicos horizontes,
é lançada em vazio,
a buscar outras imagens:
possível quebra dos vidros,
recente quebra dos sentidos.
E o que esperar?
Que o vidro se rompa com o vento,
véspera do impacto da pedra
a despertar sonhos
ou estruturas imóveis
atrás dos vidros do telhado.
Vidros.
As nossas paredes
diante da realidade
escondida pelos jornais,
camuflada pelas revistas,
escamoteada pela TV.
Diante do caos,
não basta aguardar a alvorada,
nem reclamar da chuva:
é preciso querer – e fazer com – que
a pedra quebre os vidros
e venha o sangue, os cacos, a realidade.
OS CARROS ATRAVESSAM A RUA
Os carros atravessam a rua
e a nossa existência,
enquanto olhamos calados
a imensidão do abismo
que cerca a vida das pessoas
Os dias não param de chegar,
lentos, enganam a nossa percepção
do caos do cotidiano.
E aceitamos a submissão
de maneira calma,
obediente e progressiva
O tempo é findo
Não há mais
a saída que todos esperavam
O nosso grito se calou
e permitiu que a maldade
tomasse conta de nós
Seguimos as regras
que nos são impostas
e não somos mais capazes
de duvidar, de questionar
O tempo é de “paz armada”,
traiçoeira, inquieta,
que nos mata muito mais
do que a guerra
Fim dos tempos:
A guerra vale mais
do que os momentos de paz
que conquistamos sem lutar.
A VIOLÊNCIA NOSSA DE CADA DIA
A violência habita a cidade,
mas não apenas emana
das ruas, veículos e sons
Percorre olhares e gestos,
penetra nas desilusões e negações,
na raiva insana que brota do nada
Cristaliza-se no constante descaso
diante da fome e sede inocente
dos animais esquecidos nas sarjetas
Avoluma os medos, desgasta os sonhos
em meio aos tiros, transes e tombos
que cruzam nosso silêncio covarde
Somos o motor insano de sua verve
enquanto torpes conveniências cegam
nossos olhos aos que sofrem diariamente
A violência habita a cidade
numa simbiose cínica e crescente
e se alimenta de nossa omissão.
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