Tempos líquidos e outros sentidos em Brevidade e Violência | por Marcelo Frota

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por Marcelo Frota

“Há de se viver na vertigem da queda do sonho matutino”. Essa frase que inicia o texto Vaga, um dos poemas em prosa presentes no livro Violência e Brevidade, de Elieni Caputo (Penalux, 2020), traz a inquietação e a rapidez do que está por vir na curta narrativa dessa prosa poética, assim como também é parâmetro para a poesia direta e sem rodeios que compõem a obra.

Vivemos em tempos líquidos, como afirma o filósofo Zygmunt Bauman em sua vasta obra sobre a Modernidade Liquida. Segundo Bauman; “Os tempos são líquidos porque, assim como a água, tudo muda muito rapidamente. Na sociedade contemporânea, nada é feito para durar.”. Essa urgência, essa efemeridade dos tempos líquidos pode ser sentida na poesia de Elieni Caputo, poesia essa, que se vale do que é breve e descartável para dialogar com a arte que vem dessa efervescência alucinante em que estamos todos inseridos.

Violência e Brevidade é dividido em duas partes. Na primeira, Brevidade, a autora compõe insights reflexivos sobre vivências cotidianas, vivências essas amplificadas pela sua visão precisa do mundo que a cerca. Essa “brevidade”, em que o breve assume sentido avesso, pode ser sentida no poema Esquecimento: “Teus olhos têm a chama do adeus/que se apaga quando me despeço/e desapareço”.

O adeus, bem sabem os que amam, bem sabem os que sofrem, nunca é breve. Seu alongamento pode ser percebido no decorrer e no desenrolar do poema: “…me esquecerei do teu rosto/só ficará a marca no corpo//Memória emaranhada em cinzas/lentamente apagada/constantemente dolorida/feita de carne e tecido nervoso/que não evaporam/como as linhas do teu rosto”. Essa matéria de memória, que se confundo com o corpo, com a insanidade do sentir, do negar esse sentir, mostra que de liquido, o coração tem somente sangue. Viver não é breve, não é fácil, raras vezes é liquido.

Na segunda parte, Violência, a obra abre suas portas para as ruas, para a contemporaneidade que chamamos de modernidade (perdão pelo insight de mestrando em filosofia e outras áreas da educação), para a barbárie de se permitir sentir em uma sociedade em que o emoji é sinônimo de felicidade, em que as pessoas pensam que conhecem outras pessoas, apenas por ver suas fotos e suas postagem em mídias sociais.

Esse imediatismo e essa facilidade de se conectar/desconectar é vista no poema Procedimentos: “Chegamos ao ponto do avanço tecnológico que/desliga alguém com um botão/Apaga o peso da consciência com o botão/Deleta o seu ar incômodo/Respira com uma maquinaria/adia a morte”.

Essa facilidade de conectar/desconectar é o que torna o tempo liquido possível, e o que está tornando a vida tão fácil de ser vivida em frente as telas dos computadores e celulares. “Desligar alguém”, tão cômodo, tão automático, que o sentimento de quem é desligado/desconectado/excluído, nada mais é que uma carinha amarela com uma lágrima caindo. A lágrima de pixel é seca. A lágrima do rosto triste do abandonado digital é molhada, e mancha a pele daqueles que ainda tem conexões com seus sentimentos e se permitem chorar.

Essa, e outras agressões compõem a Violência retratada por Elieni Caputo em seu Brevidade e Violência. Um livro para ser apreciado com a urgência do nosso tempo, e para ser sentido/refletido, com os ares da contemplação.

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