Ode aos ratos | por Fernando Andrade

AFernando - Ode aos ratos | por Fernando Andrade Fernando Andrade | escritor, jornalista e crítico de literatura.

 

 

 

Ali havia uma ratoeira com uma isca dentro: um delicioso pedaço de queijo. De todos os móveis de dentro do apartamento a ratoeira era para o condômino de 203 o item mais importante do apartamento. Pegar ratos para domesticá-los. Dar a noção de espaço longo à estes seres degredados e banidos em buracos e lugares sujos. Depois de presos eram recondicionados a usar a liberdade de formas mais profícuas com o meio social. A cada rato solto o condômino dizia ao roedor – aproveite a hospitalidade da casa. A liberdade garantida para o movimento solto e curioso do bicho fazia-o esquecer de seus hábitos e vícios. O fato de ter total liberdade de convívio com quem lá chegasse fez cada um olhar-se no espelho e readquirir uma nova auto – imagem. O convívio social porém foi feito aos poucos, a comida dos ratos ainda eram separadas dos moradores. Seus modos de comer ainda causavam repulsa principalmente em visitantes que quando chegavam ao 203 ficavam com alguma cerimônia de aceitar um simples copo d’’água.

O morador avisou ao chefe dos roedores que eles não poderiam ficar ali, só comendo sem nenhum comprometimento profissional. Desde então foram treinados para exterminar as baratas que assolavam o 203. O que se via era uma longa caçada de roedores em busca de uma provável nova cadeia alimentar é uma profissão: Dedetizadora de baratas. Em dois meses o índices delas baixou drasticamente, e não era raro eles até assistirem aos desenhos animados da Disney junto com as crianças. Através do convívio social adquiriram uma tendência ao humor e as piadas, e não era raro entres eles ridicularizam um ao outro em um algum aspecto idiossincrático. O morador do 203, preocupado, com o aumento de conhecimento humano dos roedores resolveu retirar da sala os livros, romances; ensaios de filosofia e psicanálise para um sótão, lugar onde eles tinham vindo e provavelmente não gostariam de voltar nunca mais. Trancou com uma chave e disse ao rato chefe que ali havia uma peste como aquela descrita no livro do Camus e que eles seriam extintos se lá entrassem. Em um determinado ponto de suas consciências, a dúvida assomou à curiosidade e começou a pressionar as mentes, principalmente, dos mais jovens. Começaram a ter reuniões clandestinas para tentar entrar no sótão e ver o que lá era tão proibido. Começaram a fazer estudos de caminhos que pudessem levar até o sótão, aos poucos, eles foram desaparecendo do 203. O dono, às vezes, chamava pelo nome de algum e só recebia, silêncio.

Please follow and like us:
Be the first to comment

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Social media & sharing icons powered by UltimatelySocial