FERNANDO ANDRADE: Teus livros que eu li A busca dos loucos e D. o procurador tem uma escrita bem investigativa lidando com questão do duplo e e do espelho entre personagens que se procuram\ aproximam por algum espírito de curiosidade sobre o outro. Esta relação também é projetiva ao trabalho da escrita, o autor procura seu leitor numa viagem sobre a natureza humana. Como se dá esta reflexão na sua escrita.
FAUNO MENDONÇA: A reflexão exposta na minha escrita centra-se na procura de entender o outro e compreender o universo que existe ao meu redor, a fim de tentar desvendar os paradigmas que estorvam a autorrealização.
Trata-se de uma busca insana, realmente é uma viagem, ao seguir para o subterrâneo das mentes e das almas corrompidas e alteradas por fatores externos.
Digo insana, porquanto a questão é tão complexa que somente os “loucos” teriam coragem de adentrar em suas próprias entranhas para extrair a verdade e ainda rastrear vivências alheias.
Nos dois livros citados, os personagens têm essas tentações insólitas e incontidas de tocar concretamente nos seus sonhos e nas suas verdades, mesmo que isso lhe custe a própria vida.
A descoberta de si mesmo significa uma profunda libertação, por isso a morte não tem muito significado para eles, visto que, o limbo já compõe seus ambientes insossos e sem norte.
Por tudo isso, de fato o duplo e os espelhos estão presentes nas obras. Nelas existem um olhar introspectivo que busca analisar rigidamente de dentro para fora tentando afastar e esquecer as dores do ego. Um encontro às escuras consigo mesmo ao lado de um mundo cheio de armadilhas e reverberado por sentimentos confinados de outras pessoas. O consciente luta para vislumbrar e suprimir um inconsciente transgressor.
E como não há vida solitária, necessário se torna ainda devassar no outro, respostas e contentamentos perdidos ou ignorados.
Por óbvio que, por se tratar de ficção, minhas reflexões são exacerbadas beirando, às vezes, ao quase delírio, sobretudo, no livro “A Busca dos Loucos”.
De qualquer forma, os temas adentram em locais proibidos, como a entrega da vida à morte, a ausência da capacidade de amar ou simplesmente ser alguém que não aceita o mundo, mas dele depende para se sentir entorpecido pela vida.
São muitos os fatores que compuseram os personagens. Fatores esses que perambulam pelas esquinas, pelas noites mal dormidas e por questões que não têm respostas capazes de explicar algo e indicar o melhor caminho.
FERNANDO ANDRADE: O trabalho de linguagem através da palavra e seus sinais e silêncios é também muito desenvolvida no seu texto. Como você pensa esta escuta (entre falar e ouvir) entre seus personagens quando desenvolve o enredo em que eles estão inseridos?
FAUNO MENDONÇA: O falar e o ouvir advêm dos egos enfurecidos dos personagens e de seus “eus” observadores, os quais estão imiscuídos em realidades que não têm capacidade de acompanhar seus sentidos e sentimentos.
Eles ouvem a si mesmos e falam não somente para o exterior, mas, principalmente, para seus mundos barrocos, promíscuos e imaculados, na intenção de saírem da dormência dos comuns. Eles gritam com as forças de seus tormentos para que suas almas saibam que jamais se tornarão escravos de si mesmos ou de outrem.
Apesar do silêncio concreto, em todas as suas falas apontam para a luz no final do túnel. São sedentos para sair de sua escuridão e dizer que querem vida em seu zênite. Não aceitam migalhas sentimentais como a maioria das pessoas aquiescem.
Os enredos dos livros transitam nesse cenário.
FERNANDO ANDRADE: No D.procurador, você atualiza o tema do vampiro, o ser carregado por alguma sina da condição humana. E o tempo é muito importante na formação da psique humana, ele é ao mesmo tempo lastro e destino sobre o tempo que passa e molda. Queria que você falasse um pouco sobre isso, no seu livro.
FAUNO MENDONÇA: O tempo trata-se de algo muito mal resolvido ante a fragilidade da consciência humana. Na verdade, não há como mensurá-lo e cada criatura o vislumbra de forma diversa. Algum fato pode durar anos e esgotar todas as suas nuances em um lapso muito curto ou em um interregno maior do que o transcurso do calendário.
No livro D. e o Procurador, Connor Burke e Drácula tinham tal noção, mas também padeciam dessa pouca compreensão sobre o transcurso dos anos.
Drácula era um pouco mais lúcido do que o Procurador sobre as passagens dos invernos, mas ambos sabiam que eram limitados nesse aspecto. Por esse motivo deveriam seguir em frente com obstinação, sob pena de esvair o prazo e não galgar seus desideratos.
De modo que o fator tempo teve peso na narrativa e demarcou o destino de cada um. Ele impôs equilíbrio perante as realizações faustosas e os infortúnios de suas vidas. O tempo sempre foi e será soberano, ele não se preocupa com a condição humana nem com a condição do Conde da Transilvânia, por isso, tanto Drácula quanto o Procurador, sofreram derrotas homéricas ao afrontá-lo.
FERNANDO ANDRADE: Como se dá o trabalho de estilo de escrita no seu universo com os gêneros literários? Parece que ao escrever não é apenas uma certa apropriação de revisitar temas e formas. Você de certa forma atualiza aquele universo em questão. Fale disso.
FAUNO MENDONÇA: As leituras de situações e os sentimentos não são estáticos, eles mudam tal qual mudam as estações.
Não há como fugir disso. É impossível manter as mesmas impressões ao longo da vida.
Essa dinâmica marca cada palavra que escrevo, mas há temas atemporais que são constantes em minha escrita por tratar de assuntos que afligem o ser humano independentemente de qualquer fato objetivo.
Para exemplificar isso, quando resolvi escrever “D. e o Procurador”, busquei essas mudanças, apesar de que, na obra de “Drácula” de Bram Stoker, esses sinais estavam bastante vivos, porém, procurei realçá-los, respeitando a concepção de mundo da Era Vitoriana.
Portanto, não me preocupo, quando escrevo, em seguir gênero literário específico, apesar de saber que meu trabalho tem critérios formais, contextuais e semânticos, os quais se enquadram em algum gênero.
O mais importante para mim não está na forma, mas no conteúdo para tentar transmitir às pessoas que precisamos descobrir nosso verdadeiro caminho. – Siga sua luz, só isso.
Siga sua luz, mesmo que seja uma mera luz de vela. Ela indicará o melhor rumo. A vida é muito curta para ficar dando voltas sem nexo e não sorver aquilo que de fato importa. Cada ser tem seus sonhos que devem ser preservados.
Óbvio que isso tem um custo, mas precisa ser assumido, sob pena de se tornar um sonâmbulo ao lado da incompreensão do mundo. Esses são os parâmetros de minhas atualizações na escrita. Acho que não conseguiria fazer diferente.
FERNANDO MENDONÇA: Queria para fechar esta entrevista como é seu processo de criação? O que procura ao começar um novo livro? Uma ideia sobre o tema, ou a forma da escrita é que vai direcionar o caminho do romance ou projeto?
FAUNO MENDONÇA: O meu processo de criação centra-se em desnudar as pessoas, o universo e a mim mesmo. Mas, claro, deve existir uma estória a ser contada, no entanto, a forma e aquilo que passará no curso do enredo não mantenho uma regra fixa.
Cada linha implica em outra, assim, o fluxo natural da escrita segue buscando compreender a consciência alheia e a minha própria ao lado de uma atmosfera que não se tem muito controle.
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