Fernando Andrade | escritor e crítico de literatura
Projetamos uma tela na nossa frente e lá despejamos todos os resíduos humanos que são indesejáveis. A tela já funciona sozinha com uma projeção de nossas vilanias latentes. Mas o homem violento não sabe que a tela filma seus desejos inconfessos. Publica suas teses de homicídios latentes. A violência que parte do corpo para lá nunca se reconhece como ponto de partida. É outra violência que está sendo capturada por algum canal de emissão de uma potencialidade humana de massa de produzir o recalque humano.
Parte deste recalque individual é coletivizado por um líder que possui carisma suficiente para produzir manobras de assimilação-condução destas emoções descontroladas. Ele é o homem que existe e está por trás da tela.
Esta relação entre o que projeto como ódio e o que o líder verbaliza como produção semântica, manipulável, criando uma produção de violência seja através de competições violentas como uma rinha de cães bravios, é o tema da peça de teatro Monstro, da autora Karen Sacconi, pela editora Patuá.
A autora cria uma ação entre uma família que tem um cão que passa a ser utilizado em uma rinha. Pai e filha têm pulsões violentas sobre o drama humano. A mãe já se estabelece pela pulsão de afeto. O texto se projeta pela função alegórica de mostrar através de um texto subliminar toda a relação entre o líder que divulga e legaliza as rinhas e seus adeptos fãs que preconizam a lei da selva, do mais forte sobrevivente.
A humanidade do afeto, não se revela mais por compaixão à dor do outro, mas sim, por pura latência de uma pulsão ambivalente de autoimagem corporal. O corpo costuma cobrar no outro uma visão para si, distorcida, como uma febre delirante de percepção íntima.
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