Os versos Misteriosos de Cecília Rogers em Contas do rosário | por Marcelo Frota

Cecilia Rogers - Os versos Misteriosos de Cecília Rogers em Contas do rosário | por Marcelo Frota

 

Contas do rosário (Editora Penalux, 2021), terceiro livro da poetiza carioca Cecília Rogers cerca-se da religiosidade e do mundano para tecer versos que evocam a mulher (mãe, filha, terra, ventre) em uma poesia que evoca o amor pela palavra escrita e a cuidadosa (carinhosa) forma de celebrar o feminino. A essência da vida em homenagem aquelas que dão à luz, que são a vida e fazem da vida algo valioso.

Como as contas de um rosário, o livro se divide em partes em que a palavra Mistério é a chave de abertura de cada jornada. São eles os Mistérios Luminosos/Gozosos/Dolorosos e Gloriosos. Cada um deles com sua cadencia, seu encadeamento e virtudes de uma perfeição, que por ser humana, ou demasiado humana, é imperfeita, e assim, o elo entre a poesia e o leitor que a aprecia.

Mistérios Gloriosos tem sua força na mulher que é a vida, na mãe que é mão de um e assim, mãe do mundo. O poema Da mãe, é a síntese de todas as mulheres que geram a vida: “Maria nasceu/sob o signo/do feminino./Desce o sangue bento/do ventre ancestral.” Todas as Marias, sejam elas Marias, Joanas, Gabrielas, mães ou não, nasceram sob o mesmo signo/sina. O feminino é o gênero, a ligação que as fazem mulheres. Nem todas são mães, mas todas são mulheres. E por isso Gloriosas. São a luz ancestral que iluminam as gerações.

Mistérios Gozosos traz elementos sombrios, uma espécie de transição entre a inocência e dureza de uma realidade que se avizinha. O poema Retrato é o espelho de algo velado: Memórias do ventre/do ventre do ventre/mulheres-semente/fruto-gestantes/ A família/esconde a loucura/nos sorrisos ensaiados/instantâneo seco/retrato.” O ventre fecundado, antes celebrado, parece maculado, uma semente de vergonha que cresce junto com a barriga. Algo embaraçoso, vergonhoso cresce nesse ventre. Algo da violência? Do embaraço?… O ventre que traz o amor/também traz a dor.

Mistérios Dolorosos tem na melancolia seu traço mais marcante, assim como Mistérios Gloriosos é a redenção, a luz no fim do túnel, a fênix que das cinzas, renasce bela e pura. É nesse ciclo que a poesia de Cecília Rogers se faz relevante, ao traçar, mesmo sem personagem nomeados, uma epopeia em que o um são todos, e todos um um. A essência do somos se faz presente em seus versos, sejam esses somos masculinos ou femininos. Uma semente do amor e outra do horror.
Um livro essencial.

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