Fernando Andrade | escritor e crítico de literatura
O poeta anda, pés tocando a melodia dos pés. Mas em dado momento o poeta estanca o veio poético. Algo o suprime de ar. O ar do verso. Ele vê sinais com marca texto amarelo. Alguém falou em amarelo? Ele pensa poeticamente amar elo – amar o outro. Caminhar parece bom, bota os pensamentos para funcionar sem a danada da ansiedade.
Pensa no eu lírico, e pensa também em Godot, na espera. O eu lírico está com ele em casa, quando amamentou aquele livro sobre a pandemia. Sim, ele escreveu um livro onde a voz parece vir de um universo onírico. O poeta me liga me perguntando do meu livro em que ele fez o posfácio? Digo que está vendendo. Conto para ele as ideias que acabo de colocar no papel. De que o livro Paniricocrônicas – crônicas dos sonhos em tempos de pandemia , pela editora Patuá, é um importante inventário dos nossos dias, nem santos, e pagãos.
Falo para ele que por mais que exista no livro uma linha de corpo crítico e ensaístico, de uma muito boa relação com os fluxos da psicanálise onde eu\ externo trocam intimidades e confidências, prezo no livro mais uma corrente muito marinha onde a poesia junta as análises e raciocínios que não são lógicos ou racionais, pois Caio escreve no fluxo, sem mediação do superego, sua escrita vaza todas as porosidades do ser, medo, angústia, temor, mas também empatia, solitude.
Caio revolve o material da memória, utilizando a crônica como despiste, como falseamento. A tessitura do texto resvala no cotidiano para ultrapassá-lo por uma via mais cirúrgica. E os sonhos são linha e agulha por onde o escritor faz as curvas da malha textual e simbólica onde o próprio corpo do analista vira órgão de intenção do personagem-pessoa que faz uma espécie de filigrana da sua humana condição.
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