Fernando Andrade – A Palavra insólita me vem à mente quando leio seus contos. A ação humana parece ter duas faces, uma rotina que pode camuflar eventos maravilhosos e absurdos. Fale um pouco disso.
Alexandre Arbex – Acho que os contos do último livro transitam justamente por essa linha entre o maravilhoso e o absurdo, mas sob uma simulação de normalidade. Um dos métodos que empreguei na construção das histórias foi partir de ações relativamente simples ou de premissas prosaicas e torcê-las até desfigurá-las completamente, sem que esse artifício parecesse monstruoso ou proposital.
Fernando Andrade – Seus personagens parecem possuir um dicção muito própria. A narrativa nos seus espaços, entre começo, meio e fim, é muito bem mimetizada por muitas sensações físicas e psicológicas. Fale um pouco destes personagens.
Alexandre Arbex – Acho que as dicções dos personagens são expressões de uma mesma voz narrativa e que as biografias desastradas que os caracterizam pertencem a uma mesma coleção de pesadelos. A preocupação em acentuar as sensações físicas e psicológicas responde a uma necessidade de envolver o leitor e tentar criar entre este e os personagens uma identificação capaz de transpor a estranheza sem desfazê-la.
Fernando Andrade – Fico pensando no embate entre ciência e ficção. Os fatos e dados nas hipóteses são comprovadas. Já na ficção há um embaralhamento de postulações, dúvidas e perguntas. Fale disso.
Alexandre Arbex – Este ponto é bastante caro ao espírito dos contos desse livro, Fernando. Alguns deles exigiram um pouco de pesquisa em sites científicos, mas meu interesse era apenas reter o jargão técnico para emprestar verossimilhança às histórias. Aprecio particularmente narrativas que falseiam o discurso científico, não como sátira ou crítica, mas como uma forma de demonstrar que a própria realidade é ficcional.
Fernando Andrade – O desejo em seu avesso, relações do paradoxo, como esta afirmação se projeta no seu livro.
Alexandre Arbex – Acho que esta afirmação resume os contos em duas direções, igualmente pertinentes. De um lado, boa parte deles é contaminada por um tipo peculiar de frustração: a impossibilidade da ação e da palavra, seja por um esgotamento, seja por um estado depressivo que se alonga. Talvez isto equivalha à ideia de avesso do desejo: são personagens que não conseguem desejar mais nada. Quanto às relações do paradoxo, me parece que alguns contos sofrem de uma espécie de saturação lógica. O empenho em dotar sentido o absurdo põe em evidência essa obsessão nossa em reduzir as coisas à medida da razão ou da linguagem. No fundo, a tentativa humana de assimilação do mundo constantemente nos obriga a falseá-lo como se o estivéssemos traduzindo. Alguns contos propõem uma extrapolação desse procedimento.
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