O amor e a angústia em Versos com requintes de humanidade

Franciele Moser - O amor e a angústia em Versos com requintes de humanidade

 
 
 
 

Marcelo Frota| escritor

A escritora gaúcha Franciele Moser Bach estreia no gênero poético com Versos com requintes de humanidade (Editora Penalux, 2023), obra que segue o lançamento do livro Toc Toc, voltado para o público infantil e ganhador do Prêmio Mozart Pereira Soares de Literatura, na categoria Literatura para a Infância.

A poesia de Moser Bach traz em sua gênese as contradições que formam os seres humanos que dividem os caminhos do amor e da dor, mostrando que os homens se movem em uma estrada sinuosa de sentimentos e emoções que muitas vezes acabam por defini-los e, também definem, os rumos de suas vidas. Escolhas simples e corriqueiras transformam-se em realidades moldadas pelo mármore do cotidiano.

Dividido em três momentos, Versos com requintes de humanidade revela uma agradável e inesperada surpresa ao utilizar a forma do soneto na construção de seus versos. A escolha de Franciele Moser Bach segue na contramão da poesia em versos livres, tendência dominante no gênero nas últimas décadas e com isso traz a lembrança da poesia métrica (e viva) de Vinicius de Morais e outros mestres do soneto.

Necrologia do amor inicia o livro com uma espécie de visita voluntária pelos caminhos da memória. A sensação de lembrança de algo vivido permeia os versos que, a mediada que a leitura avança, intensificam-se em densidade e obscuridade, ao mesmo tempo em que se mantêm leves e esperançosos. Este estranho equilíbrio entre luz e sombras, amor e dor, alegria e angústia é um dos destaques da obra. Equilíbrio este que pode ser encontrado no poema Em teus olhos: “Entregam-se também por estes beijos/Frios. Mas o meu amor tão sem juízo,/Quando lembra a tristeza do teu riso,/Sofre, e por ti se esquece do que almejo.”

Na segunda parte, O homem coberto com uma folha de papel, a autora parece se afastar da memória e embarcar em uma jornada reflexiva sobre o que compõe a escrita e o pensamento. Os versos de Poeta sem palavras demonstram a relação entre reflexão e escrita, assim como as dúvidas que costumam cercar aqueles que escrevem: “Às vezes o que sinto eu tenho escrito,/Mas à realidade não faz jus,/Pois a palavra fala e não traduz/Exatamente o que me deixa aflito.”

Um barquinho de papel sobre o azul do meu coração fecha a jornada poética de Franciele Moser Bach com um olhar sobre a angústia da condição humana e como ela se exprime em uma forma de sentir coletivo. A citação de Charles Bukowski: “que seja conhecido/que eu tenho sangrado sem coroas”, presente no poema Cumplicidade, demonstra que as sombras da condição humana se estendem por todos os aspectos da vida dos homens. O poema Confissão é um amálgama entre fé, descrença e desesperança: “Igual a quem traz Deus como sentença/E Nele crê e vive e se descansa,/Mas peca e sente o mal que ali avança,/Então depois maldiz essa doença”.

Versos com requintes de humanidade é uma obra que pode e deve ser apreciada aos poucos, posto que a intensidade dos versos convida a reflexão. A leitura dos sonetos é uma experiência que pode ser desenvolvida isoladamente ou na sequência, embora eu, particularmente, recomende a leitura da terceira parte em sequência, devido a forma crescente como a poesia se apresenta. Uma leitura recomendadíssima, e estimulante.

Marcelo Frota
(autor de O sul de lugar nenhum, Amores desfocados e Os olhos de Anita)

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