FERNANDO ANDRADE: A história do país, principalmente a ditadura, é muito latente nos seus romances. Qual a preferência por este enfoque, e como você trabalhou o tema na narrativa.
VANESSA MOLNAR: Acredito que grande parte dessa influência está relacionada com a minha formação em História. Decidi escrever o primeiro romance dessa trilogia que esse livro encerra em decorrência da eleição de Jair Bolsonaro para a presidência do Brasil.
Eu assistia a televisão e simplesmente não acreditava nos disparates que estavam sendo ditos por uma parte enorme da população e então me convenci de que esse tema era necessário, de que o Brasil é mesmo um país que sofre de amnésia, de uma grande amnésia histórica e social e foi assim que minha primeira personagem, a Elle, uma professora solitária da educação básica brasileira que está para se aposentar, surgiu.
Nesse último romance, quem narra a história é a amiga dela Ana, a personagem que dá o mote para a história do primeiro livro, já que as rememorações da narradora começam quando ela fica sabendo da morte da amiga.
Considero esse último romance, em termos de pesquisa, o menos histórico dos três. Ele está muito mais centrado nos traumas pessoais dela que também foi perseguida pela ditadura, mas aborda também temas como racismo e tenta enveredar um pouco pela formação de uma mentalidade que surgiu com a ascensão de uma classe média trabalhadora operária em um determinado momento e que se relaciona com o processo de industrialização do nosso país. Eu queria refletir um pouco sobre como funciona a cabeça dessas pessoas que ascenderam socialmente graças aos direitos trabalhistas a que tiveram acesso e que agora não conseguem se dar conta disso.
FERNANDO ANDRADE – Sua linguagem me parece bastante visual, imagética-direta, sem floreios ou subentendidos. Como trabalha esta linha de escrita. Comente.
VANESSA MOLNAR: Confesso que demorei um pouco para encontrar a voz narrativa dessas personagens, mas como se tratava de um tema complexo e de uma narradora sem esperança, optei por uma abordagem relativamente direta. Além disso,
acredito que o bom romance não explica, mas mostra a história e tentei fazer isso.
FERNANDO ANDRADE – Este livro pertence a alguma parte de trilogia focando as relações político-sociais, do país. Fale disso.
VANESSA MOLNAR: Apesar de esse ser o último livro da trilogia, em termos cronológicos, ele é o mais antigo. Nele, Jair Bolsonaro ainda não foi eleito, mas a personagem já nota que alguma coisa muito estranha está acontecendo, algo que terá um retrocesso político como consequência, o que acontece um pouco depois da morte dela.
FERNANDO ANDRADE – Há uma fabulação na sua narradora não digo idealista, mas calcada nos folhetins onde há sempre personagens como uma heroína, com ideais e motivações fortes. Fale disso.
VANESSA MOLNAR: Optei por personagens femininas fortes, mas complexas. O narrador do meu segundo romance é um homem. Não sei se elas são heroínas, gosto mais de vê-las como sobreviventes. Especificamente no caso da Ana, a narradora das Formas violentas do amor, tentei criar uma personagem atravessada mais pela loucura do que pela bondade. Elas amam e odeiam na mesma proporção e enfrentam problemas com a maternidade e com as relações amorosas com as quais se deparam ao longo da vida, sem espaço para falsos moralismos.
Outro tema que tentei abordar é a questão da velhice. Como mulheres tão fortes e independentes envelhecem nessa sociedade contemporânea que alterou muito pouco a forma como ela enxerga as pessoas idosas. Esses livros fazem uma reflexão a respeito disso. Estou trabalhando em um projeto novo e não sei se esses temas permanecerão. Mas com certeza a questão da violência estará presente em suas múltiplas vertentes.
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