Fernando Andrade | escritor e jornalista
Biografar o corpo não é fazer caminhadas por ruas, viadutos e avenidas. Deixar o texto fluir pelo sangue, encher o coração da tinta mais vermelha da caneta-tinteiro-cinema que alguém escreve-filma. É ensaiar o corpo ensaio para peregrinação dos orixás africanos, para sombrear o branco da página, escrever lágrimas negras, como pedaços de letras negras com algum pincel de Miró. E latinizar o eurocentrismo, com as afros religiões bagunçar e despedaçar a muralha do extremismo até nas letras. Por isso, me sinto bem, ao ler o novo híbrido livro de ensaios ou crônicas filosóficas, sobre a brasilidade nossa de cada semana ou dia santo, do inquieto, Marcelo Ariel, Afastar-se para perto pela editora Reformatório, que mescla ficção e vida não necessariamente biográfica, mas sim, vida especular e espetacular, sobre nossa rotina de país culturalmente hipócrita, racista, meritocrata. Marcelo usa toda sua tradição de leitor cultural, antropológico, para estabelecer uma panorâmica angular por toda a faceta brasileira do comportamento social entre classes , a fome, e a farta bonança da burguesia escrevendo em todos os gêneros, da prosa à poética, do teatro ao roteiro, criando uma obra multifacetada sobre o que a palavra ficção hoje pode mimetizar a vida com ela é, parafraseando Nelson Rodrigues. Glauber Rocha, Artaud, toda massa tanto encefálica do nosso país como os trovadores da loucura criativa, da desordem do corpo em fugas. Marcelo não criou tanto um mosaico da vida brasileira, mas parodiou a gula da elite brasileira, a desonestidade da turma e não falo da classe política sempre botando placas, de pare, olhe e escute antes de seguir… contém ironia.
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