Fernando Andrade | Jornalista e escritor
Ao ir à festa de um companheiro escritor estava ele tomando um drink quando um editor conhecido dele, lhe ofereceu seu copo lhe dizendo – saúde. Tinha certa atração por doenças, algumas imaginárias, como se fossem ficções do corpo em estado febril. Não havia tomado ela ao pé da letra, como se ele pela sua fisionomia estivesse na sua cara um aspecto debilitado, e dodói. Era o editor que figuradamente lhe dava sorte, ao saber que ele estava prestes a terminar seu próximo livro de poesias. A linguagem é sempre um rumor indecifrável. Mas a saúde não era um enigma, para isso existiam exames toques e médicos de todas as especialidades. Preferiu adotar o silêncio e levantou o seu copo quase fechando um brinde ao outro sem saber o motivo, pois sabia que o editor estava em situação de falência. Seu último livro fechava uma trilogia sobre a dor, não só física, mas também espiritual até um pouco metafísica. Como levar a pedra de Sísifo a montanha acima sabendo que tinha tão pouca saúde. O convívio social estabelecia certas regras que até podiam ser comparadas com o estado do organismo que está em perfeito estado de interação com o meio. Loucos, dementes, pareciam não ter esta maleabilidade social para se misturarem ao universo personalista de pessoas normais. Pensou num poema que falava da dor da amputação, uma dor fantasma onde o braço ou perna não existia mais. Tendões, pulsões, sinapses, pensamentos eram certos reinados para uma completa imersão na vida midiática. Viu depois de se afastar daquele editor, uma antiga conquista sua que não havia dado muito certo. Voltar ao passado, era quase como viajar para um país longe muito longe. A dor que deveras sentir não era uma invenção do Pessoa. Todo poeta é um fingidor. Até na arte do flerte se finge algo que não poderá ser, quase como assumir uma persona. Dor elegante já dizia outro poeta de Curitiba, já parecia mais condizente com uma paquera numa festa literária. Aproximou-se da moça, mas ela o olhou e sorriu algo como uma pintura da Vintiana. Ela estava com o copo vazio, ele externalizava que precisava de um pretexto para puxar conversa. Procurou um garçom mas não o encontrou. Quando saiu para o jardim, viu ela vindo em direção à ele. Parecia que queria falar, mas da boca dela saiu um declamante poema, que ao longo da récita ele foi se misturando ao estado entre sonho, fantasia e escapismo. Era um poema dele totalmente, inédito, como podia.
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