Por Ana Meireles
No começo da leitura dos contos que compõem uma impressão de unidade entre si, me pareceu, em princípio, estar adentrando no reino das coisas que não se apreende de primeira. Bom, eu creio que tratando-se do conto como gênero literário , a intenção do autor não foi outra . E convenhamos: Aquilo que é entregue de bandeja não tem a menor graça. É preciso que se dê chance a uma sacada, um lance singular de olhar , do pensar , digo, de ler e subtrair para entender. Entender ??? Mas quem foi que disse que era essa a intenção do autor ? Ah, vai , essa coisa de entender passa pelos diversos crivos da mente. A imaginação é um reino rico de cenas , imagens e fantasias. Cada um leva sua mente para onde quer. Cada ser converge as “ suas cenas” para onde quer que, ora, pois, dá licença? Ele, o autor de “ DEUS e o Peixe-Voador” deu a sua pele , a sua carne, a sua marca. Escreveu como se fosse do seu intuito fugir ao estabelecido , ao posto . E ao meu ver assentou-se num lugar de relevância. Deu a sua própria veia imaginativa para compor voz e personagens.
E , de repente, se em princípio estranhei conhecer um Judas traidor na pele do melhor amigo de Deus, pude entender sua performance ficcional, sua prenhe inserção do conhecimento bíblico voltado para o que distorce, subverte, mostrando a “clara verdade” de que “ nem sempre o que se vê é o que realmente é “.
Mostrando que, no reino da mente , rei é quem dialoga com suas criações. Aquele quem faz a fantasia confundir-se com “ a verdade da realidade “. Mas que verdade?Verdades muitas vezes têm vidas voláteis e mentiras por vezes ganham tempos de eternidade. Vá lá se saber o que brota nas mentes…
Entre alucinações e delírios estão os desejos da alma. Nos dias de hoje quantos são os que têm em concretude de verdade os fakes News ? Os contos do autor me dirigiram a este olhar.
Quantos são os Barrabás, os Judas, os Papas Leões X que se assentam à mesa no lugar de juízes a decretar sentenças de condenação?
Sim, se no começo eu estranhei, pois que me vi acessando memórias retrógradas para me situar diante dos personagens bíblicos, no meio do caminho me encontrei, ou achei que me achei.
Não sei mesmo o gosto que tem o composto bebido pelo personagem Ari – personagem do conto ao qual muito gostei – , mas, considerando a realidade que nega o ficcional, eu por minha vez também declaro-me um tanto quanto de ressaca.
Deus e o Peixe-Voador , embora seja uma coletânea de contos , desperta-me as ideias para o momento presente da realidade politica/ religiosa da sociedade brasileira. Estão muitos com a razão mergulhada na tela de um celular, embebidos no estado de inconsciência provocado pela “Ayahuasca”, sem saber vencer o abismo provocado pela boca dos homens.
E a despeito dela, a ressaca que a mim advém do viver, afirmo valer muito a pena a leitura de“ Deus e o Peixe-Voador”, do escritor Douglas Oliveira, e recomendo-a.
Seus contos de cunho satíricos são de fazer brotar novas e interessantes criações e representações na mente. A realidade muitas vezes em contraste com a ficção não se apresenta como texto de expressão distanciada desta última, a ficção. Os mortos de outrora estão sempre a ressuscitar…
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