“algumas esperas não latejam” – Três poemas de Deolinda Nunes

 

I

há correnteza 
no rio do tempo
há movimento
nos lençóis freáticos
o sangue corre 
em corpo vivo
isso nos difere
dos mortos:
emanamos calor quando
estamos vivos
desumano é todo o 
            coração gelado

 
 

II
teu sorriso indica a direção das gaivotas
teu sorriso chama o meu sorriso-perdido
puxa a cadeira e senta pra me contar
das curvas que se erguem nas abóbodas
e das folhas que caem dos plátanos
teu sorriso fala do sul e do oeste
da espera na fila do cinema 
algumas esperas não latejam
teu sorriso agora não é silêncio
de chave, não é silêncio de 
carta não escrita, não é 
silêncio na estrada: música!

 
 

III
ruptura e queda
equação falha
não cheguei 
aos noventa e dois
não cheguei ao zero
não cheguei aos portos
vazios de desacordo
aos pés fartos
de caminhos plenos
[até agora, ninguém 
conseguiu medir o 
campo magnético 
que emana da água 
em movimento]
não consegui chegar
em mim, sou partida

 
 

Deolinda Nunes, apaixonada por poesia desde a adolescência. Publicou três coletâneas poéticas,  Encontrar-te,  Além da Palma da Mão e Olho D’Água pela editora CBJE.
No início de  2017 organizou juntamente com  Wanda Monteiro uma antologia poética com a participação de 30 escritoras de vários lugares do Brasil “SETE feminino de luas e marés” pela Editora Essencial. Recentemente publicou pela editora Archangelus duas coletâneas:  “in corpóreo” e em parceria com a escritora Maria Lúcia López “cartas e silêncios [policromia] .
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