FERNANDO ANDRADE – Seus poemas tem um pouco a leveza do haikus japoneses onde a escrita não segue um fluxo grande de palavras, mas há na quantidades deles, muitas pequenas epifanias a revelar. Como é este seu processo criativo com relação as imagens poéticas?
SABRINA DALBELO – Fernando, inicialmente, é necessário que eu expresse a minha alegria em ser entrevistada por ti. Percebo, pelas perguntas tão sensíveis, que foste na essência do meu livro e essa leitura cuidadosa, para mim, é o sucesso que todo autor almeja. Muito obrigada!
Os poemas do “lente de aumento para coisas grandes” resultam de uma organização cuidadosa de muitas coisas que eu vinha escrevendo, principalmente nos dois últimos anos (2017 e 2018), quando descobri o formato do “meu” poema. Eu fui exercitando esse fluxo de ideias com poucas palavras, cada vez mais, e, com isso, me acostumando com o resultado. E fui gostando dele.
O mais interessante é que, ainda assim, vejo que até os pequenos poemas geram interpretações múltiplas, aos olhos dos leitores. Isso, a meu ver, reforça a impressão de que quando nasce a poesia, na cabeça do escritor, embora este a imagine com um belo vestido florido, na verdade, ela é enviada ao mundo totalmente pelada, pois é o leitor que escolhe o seu modelito, ao lê-la. Essa possibilidade de sensações multifacetadas e ilimitadas, a partir da leitura, é algo mágico!
Eu acredito que muita coisa pode ser dita com pouco. E aí estão o provérbio popular, “para bom entendedor, meia palavra basta”, e a máxima da lógica “quanto menor a extensão, maior a compreensão”, que não me desmentem.
Outro fator que acabou contribuindo para minhas construções poéticas serem mais curtas é o fato de eu comumente postar o que escrevo nas redes sociais, logo quando vem a ideia. As redes sociais sugerem que sejamos mais diretos, até para termos maiores chances de leitura. Para formar o livro, revisei o que tinha postado na internet e, pelo tempo entre a publicação e a releitura, me senti confortável para lapidar alguns poemas. Isso foi importante para organizá-los.
A ideia do livro está delineada no título. O que tentei foi chamar o olhar do leitor para as grandes coisas que nos circundam, das mais simples e cotidianas, às mais complexas e raras, me utilizando de poucas palavras.
FERNANDO ANDRADE – Como é a memória para a poeta Sabrina, do que você guarda (lembrando que guardar em italiano é olhar) Olhar para dentro de si. Como a poeta se guarda?
SABRINA DALBELO – Muito interessante essa pergunta (… e vou assistir ao filme “A Viagem do capitão Tornado” que tu me indicaste, de onde veio a referência do olhar / guardar).
O olhar é o instrumento mais importante para a minha escrita. Meu combustível é a percepção. Sei quase nada de métricas e de estruturas poéticas, mas aceito as palavras que se formam na minha mente como resultado das coisas que vejo, percebo e sinto. Às vezes, essas palavras me ocorrem em forma de pergunta, pois não me esforço para entender o que me ronda, mas tento percebê-lo.
Com isso, qualquer coisa, pessoa, contexto, situação, corriqueira ou rara, passa direto pelos meus sentidos e deságua na ponta dos meus dedos, após alguns momentos de elucubração.
Não raro, questiono e confronto os leitores, chamando-os a OLHAR as coisas, não apenas passar os olhos por elas. Uma chuva que molha lá fora pode ser apenas um fenômeno da natureza. Perceber que, em razão dessa chuva, as pessoas se reúnem, convivem e podem ser mais ou menos felizes por isso, é sobre o que escrevo.
Eu tive a oportunidade de falar de poesia em algumas escolas, para crianças de 4 a 6 anos, e foi muito legal. Disse a elas que qualquer um pode fazer um poema. Para isso, deveriam fechar as duas mãozinhas juntas, em forma de um binóculo, e mirarem em algo, em qualquer coisa. Daí disse que tudo o vem desse olhar passa direto ao coração, fazendo referência aos sentimentos. Pronto, as palavras que nascerem disso são poesias. Foi uma graça aquela criançada toda fazendo esse exercício.
Por último, no que diz respeito ao que eu literalmente “guardo dentro de mim”, eu acho que não guardo nada. Meus poemas são muito eu. Sou muito honesta, transparente e não sou de rodeios, como a minha poesia. Sobre isso, eu tenho a alegria de ter sido muito bem captada pelo querido amigo Gustavo Melo Czecter, que prefaciou o livro.
FERNANDO ANDRADE – Seus poemas me lembraram aquelas casas do interior (Fazendas) com espaços onde podem existir baús, fogão à lenha, porões onde tem-se as tralhas que não se põe mais as mãos. E você desliza o afeto por este espaço não tentando ocupação, mas sim apenas, uma fina camada de pertencimento. Fale um pouco disso.
SABRINA DALBELO – Que bela pergunta, Fernando. Como disse, mostra o quão sensível é a tua percepção sobre as coisas em que te debruça.
Exatamente isso. Minha poesia não costuma falar do perfume das flores. O que eu quero é lembrar da estrutura que faz as raízes sustentá-las, porque a gente costuma esquecer das partes escondidas. Eu vou a esses lugares, sejam eles escuros ou iluminados, e sacudo a poeira nos olhos dos leitores.
Não precisamos morar nos melhores lugares do mundo, mas também não podemos negligenciar os piores. Podemos passar por quaisquer deles e resgatar algo de nós mesmos. Talvez aí esteja o pertencimento.
Eu respeito muito as dualidades e me sirvo delas para escrever.
FERNANDO ANDRADE – Há uma poetização da natureza nos seus poemas, como se a poeta quisesse humanizá-la com dotes humanos. Como a natureza pode ser imaginada pela poesia?
SABRINA DALBELO – Somos a natureza, fazemos parte de um todo muito, muito maior do que nós.
Como mencionei, a intenção do livro é trazer o olhar para as coisas grandes. E a natureza é uma “coisa grande” sobre a qual é muito interessante colocar uma “lente de aumento”.
Sobre a humanização da natureza, creio que pode ser resultado das minhas influências literárias, tal qual Júlio Cortázar. Foi a partir dele que percebi que eu poderia ser livre, escrever sobre qualquer coisa e aí eu venho me desafiando a estender meus conceitos, cada vez mais.
Além de escrever poesias, eu me aventuro nos contos. Claro, nitidamente, meus contos têm viés poético. Inclusive, estou trabalhando num novo projeto, também já apoiado pela Editora Penalux, de prosa poética. É muito bacana desenvolver um outro formato de escrita, mais profundo, tentando manter a fluidez da leitura. Eu preciso me desacomodar. Espero que fique bom.
Claro que as poesias curtas não deixarão de existir, pois elas surgem a toda e qualquer hora, não posso evitar.
FERNANDO ANDRADE – Como está o trabalho de corpo-a-corpo do livro, como é sua divulgação? tens blogs?
SABRINA DALBELO – Fernando, o trabalho de divulgação é uma soma de esforços meus e da editora Penalux, que faz um trabalho competente e é extremamente respeitosa com seus autores. A propósito, fiquei muito feliz de meu livro ter sido aceito para publicação pelo Tonho França, que é muito atencioso. Sinto que faço parte de uma família, agora.
Eu fiz dois lançamentos do livro, em outubro de 2018, um em Porto Alegre/RS, minha cidade natal, onde ainda tenho muitos amigos e parentes, e um em Bento Gonçalves/RS, onde resido desde 2008 e já formei uma boa rede de amigos.
Afora isso, disponibilizei os livros para compra diretamente comigo, autografados, com marca-páginas especial, com envio pelos correios para qualquer lugar do país.
O trabalho em parceria com a editora consiste, basicamente, em distribuição de alguns exemplares para resenhistas e críticos literários e, também, para sorteios.
Com isso, já tive a oportunidade de receber ótimas resenhas de Marcelo Adifa, no Blog Ambrosia, de Luigi Ricciardi, no Blog Acrópole Revisitada e de Mairton Salvattore, de O Refúgio Literário, além de receber indicação de leitura de dois Igs Literários: @docegostodaleitura e @capadurabooks
Sempre que eu posso, faço postagens sobre o livro nas redes sociais Facebook e Instagram, nas minhas páginas pessoais: <https://www.facebook.com/sabrina.dalbelo> e @sabrinadalbelo
Além disso, estou aqui, respondendo essas perguntas de extrema sensibilidade, que serão postadas no querido “Literatura e Fechadura”.
A divulgação é um trabalho difícil, diário. Por isso, considero o maior sucesso ter leitores. Cada vez que uma pessoa que não me conhece me procura para saber do livro recebo uma dose de otimismo, pois é a minha poesia sendo vista pelo que ela é, não por mim. Isso é demais.
Obrigada, Fernando! Muito obrigada.
1 – https://ambrosia.com.br/literatura/sabrina-dalbelo-a-grande-poesia-das-coisas-do-dia-a-dia
2 – <https://acropolerevisitada.wordpress.com/2019/02/08/a-vitoria-e-um-risco-em-linha-torta
Achei ótima a entrevista, com perguntas e respostas delicadas e sensíveis, Além de muito inteligentes, trazendo um reflexo do que senti ao ler ‘Lente de Aumento para Coisas Grandes’ . Parabéns aos dois
Eu faço questão de agradecer novamente a oportunidade de ser entrevista pelo Fernando e de a entrevista ser publicada aqui, nesse Blog tão versátil e rico em literatura. Obrigada!