O DIA QUE EU LI JOHN DONNE À LUZ DE VELAS – (1º LUGAR – JORGE AMANCIO / DF)

 

 

1º PREMIO LITERÁRIO POETA BRUNO CANDÉAS

1º LUGAR – JORGE AMANCIO / DF

 

 

O DIA QUE EU LI JOHN DONNE À LUZ DE VELAS

O ambiente mal ilumina as palavras sussurradas
A harpa trincoleja o ar, vibra as esculturas de barro
A música relaxa o ambiente anunciando a poesia

Peço um suco de uva Isabel com notas de gengibre
Na mão direita, uma lanterna rústica ilumina o poema
                                            Elegy: Going to Bed, de John Donne
A respiração ofegante aquieta os sussurros
Um facho de luz em John Donne!
Tomo lentamente um gole de Isabel

Com a voz trêmula na tradução-arte de Augusto
                                 “Come, madam, come, que eu desafio a paz
                                                       Até que eu lute, in labour lie.”
No anticrítico de Campos, do primo pobre de Shakespeare
                                      Off with that happy busk, whom i envy,
                              That still can be, and still can stand so nigh”
A recriação na melodia do poema renascentista
Augusto-Donne -Campos-John
                                         “Tira o espartilho, quero descoberto
                                       O que ele guarda, quieto, tão de perto”
O tilintar da harpa na taberna,
Transportou-me ao século XVI,
Absolutista, calvinista, puritano
                                                  “O corpo que de tuas saias sai
                         É um campo em flor quando a sombra se esvai.
                                             Tira os sapatos e entra sem receio
                                Nesse templo de amor que é o nosso leito”
A voz grave pulsa, o poema aumenta o ritmo
                                 They set our hairs, mas sim a carne em pé
Encho a boca de Isabel,
rosando os lábios de uva
A harpa toca notas espaçadas de uma melodia conhecida
Repouso a luminária na mesa em quatro fachos de luz
                                     Deixa que a minha mão errante adentre
                                  Atrás, na frente, em cima, embaixo entre.

Recito preenchendo o vazio das notas iluminado pela luz fraca
A voz da taberna, que antes quieta, canta contínua uníssona
Canta Caetano, sem saber quem é Donne, que é um John, um João
                                             Minha América! Minha terra à vista,
                           Reino de Paz, se um homem só a conquista,
                                          Minha mina preciosa, meu Império,
                                       Feliz de quem penetre o teu mistério
A música serpenteia nas cavernas das estatuetas da taverna
Preenchendo a casa de som, de Donnes Augustos Joãos Campos
                                        Full nakedness! Todo prazer provém
                      De um corpo (com alma sem corpo) sem Vestes.
Isabel eterniza o gosto de uva na boca
As vozes se encontram, dançam, brincam no poema
Trazem memórias, recito Augusto na arte tradução de Donne
Não importa! A magia impera, é um livro místico
                                                 …(a que tal graça se consente)
                                               É dado lê-la. Eu sou um que sabe
Numa brecha do silêncio, a voz baixa pausa os últimos versos
De Elegia: Indo para o leito
                                                   Como diante da parteira, abre-
                                               Te: atira, sim, o linho branco fora
                                          Nem penitência nem decência agora.
                                         Para ensinar-te eu me desnudo antes:
                                        A coberta de um homem te é bastante.
O silêncio aquietou a taverna, aquietou a noite, o tempo,
Em êxtase levei Isabel à boca, suguei o líquido vermelho,
Na tentativa de que a realidade voltasse …
Donne nos absolveria de qualquer volúpia de qualquer prazer
As chamas dançam na quietude
Longos beijos saúdam a elegia,
Eu e a harpa não nos beijamos,
Sentíamos o após gozo lado a lado de olhos dados
Bocas ovacionam, mãos se agitam no ar, aplaudem!
Sabíamos que estávamos voltando do século dezesseis,
Da cama de Donne, levados por Augusto eu e a harpa
…peço uma garrafa de Izabel, com notas de gengibre
A taverna aos poucos com as cadeiras vazias
As pessoas levam a cama de John Donne
Com a semente anticrítica de Augusto Campos
As cadeiras dormindo, nos deixando…
Despedindo-se de mim, de John, Augusto e da harpa
Dei um longo, apaixonado e último beijo em Izabel
E fui….
                           No dia em que eu li John Donne à luz de velas

 

 

 

JORGE AMANCIO – Licenciado em Física, pós graduações em Matemática para Professores e em Problemas de Geometria, todos pela Universidade de Brasília. Exerceu a profissão de Controlador de Tráfego Aéreo e de Professor na Secretária de Educação do DF.
Fundador do Centro de Estudos Afro Brasileiro e Fundador do Grupo Cultural Axé Dudu.
Pertence as seguintes entidades literárias: Academia de letras do Brasil- secção DF, Coletivo de Poetas de Brasília, Sindicato dos Escritores do Distrito Federal e Viva Arte. A formação não acadêmica se constitui na literatura, na poesia especificamente, tendo publicado NEGROJORGEN, poesias – Thesaurus ed. 2007, em 2016 NEGROJORGEN edição de bolso pela ACE – Comunicação e Editora. Batom d’amor e Morte, poesias Thesaurus ed. 2014 e NÓS OUTRXS, poesias – Semim ed., tendo participado de inúmeras antologias, poemas publicados em revistas e jornais nacionais e internacionais

 

 

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