Marcelo Frota
crítico literário e professor
O tempo, essa trama imensurável que regula a vida do homem. Ansiado e temido por sua inevitabilidade. Mensurado em horas, dias, meses e anos. Coisa intangível, invisível, arma mortal para o amor, para o ódio. Instrumento que mede a vida; regula sua duração; assusta aqueles que temem a morte; e alegra, aqueles que celebram a vida.
O tempo, e suas facetas, está no cerne do primeiro livro de Elke Lubitz (Editora Penalux, 2019).
Poeta em formação, Elke Lubitz nos traz sua percepção do tempo em versos curtos, refletindo sua passagem e sua significância. Poetizar é passar algo de nós, e esse passar acaba por nos revelar ao mundo, nus, desmascarados e em harmonia com nossas vivências e cotidiano. Refletir sobre o tempo, talvez, seja um dos temas mais caros na poesia, seja essa reflexão percebida de forma direta, ou nas entrelinhas do poema.
O poema que abre o livro, Um quase agora, traz em si a gênese do que está porvir na obra de Elke Lubitz: “A palavra tempo/Desliza entre escuros/ céus de tantas bocas”.
Ao falar do tempo, o mesmo se faz presente no âmago da vida, do cotidiano, daquilo que faz os dias. Vociferamos o tempo com tantas incertezas, que ao fazê-lo, mal percebemos que dele falamos. O tempo é um continuo de ‘quases’, de ‘talvezes’, de expectativas. Uma ode as possibilidades, e as perdas.
Em Dias, a poeta faz uma reflexão do tempo que nos parece perdido, e em sua simplicidade lírica nos traz a certeza de que a maioria dos nossos dias são de insignificância. O transcorrer da vida nos proporciona tempos de extrema felicidade, outros tempos de infinita dor, mas fora dos extremos, os dias costumam ser uma repetição das horas, envoltas em afazeres e rotinas.
“Há dias dourados/Feito saudade/Ficando no sol/Há dias morosos/Feito saudade/Pairando no ar”. Esse retrato do tempo, em sua quase insignificância, é o resumo do tempo que nos devora a vida, que nos aproxima da morte, sem que percebamos.
A proposta de Elke Lubitz é retratar o tempo e suas contradições que nos leva, como leitores, a refletirmos sobre nosso próprio tempo, sobre como o fazemos ser nosso aliado, ou nosso nêmeses.
Ouso, e posso ousar, recomendar tanto a poeta, como aqueles que se aventurarem na leitura de Um quase agora, ler a poeta americana Elizabeth Bishop. As reflexões de Elke Lubitz a trouxeram à minha lembrança.
Marcelo Frota é professor e tradutor. Nascido no Rio Grande do Sul em 1979, é apaixonado por cinema, literatura e música e tem apreço especial pelo jazz e pelo blues, sem deixar de lado o rock clássico e a chanson francesa. Considera-se um cinéfilo devoto e apaixonado pelo cinema europeu, americano, latino-americano e brasileiro. No seu coração literário os espaços são ocupados por autores que vão de Shakespeare a Saramago, sem nunca abandonar os romances policiais baratos, a ficção científica e a poesia marginal.
“Há dias dourados/Feito saudade/Ficando no sol/Há dias morosos/Feito saudade/Pairando no ar”
Isso daria uma bela canção…
obrigada !!!