O AFETO EM RUÍNAS NAS PALAVRAS DE ELIZZA BARRETO – por Marcelo Frota

AFETO EM RUINAS - O AFETO EM RUÍNAS NAS PALAVRAS DE ELIZZA BARRETO - por Marcelo Frota

 

 

As lembranças que temos ao longo da vida, com momentos marcantes que nos fizeram felizes naquele instante, momentos estes, vividos diante de pessoas que amamos, além de trazerem felicidade, por vezes se tornam ruínas, nossas ruínas. Isso é mostrado por meio de palavras diretas, suaves, por meio de um ritmo poético que só Elizza Barreto em Afeto em Ruínas (Editora Penalux, 2020) é capaz de fazer com maestria, tanta que, toca profundamente o leitor.

Arquitetonicamente a palavra ruínas nos remete aos destroços de estruturas físicas, já aqui, pode ser relacionado com o esquecimento, e ou, bloqueio de lembranças e porque não, saudades. Por vezes, nos pegamos lembrando do cheirinho de nossa mãe, aquele cheirinho característico de uma pessoa amada, por outras vezes, lembramo-nos do cheirinho de nossa comida preferida que só nossa mãe, e que por vezes, nossa avó sabia como fazer.

Outra lembrança que geralmente nos atinge é o aconchego do colo de mãe, aquele que curava tudo, sempre que estávamos tristes ou com algum problema. Esse colo sempre teve um poder curativo que nos ajudava a resolver qualquer problema.
Infelizmente nos tornamos adultos e perdemos esses momentos tão preciosos. Nossas memórias depois de tempos distante da antiga vida se tornam ruínas.

Isso é visto no primeiro poema de Afeto em Ruínas da autora Elizza Barreto, nomeado Criança ferida, onde podemos ver a projeção, que muitas vezes, os pais fazem em seus filhos, pois a vida que eles tiveram não é como a nossa. Isso pode ser entendido no início da primeira parte deste poema quando a autora nos fala “filha/ você é tudo aquilo/ que eu não consigo ser”.

De fato é verídico que pais protegem seus filhos, por vezes, sufocam, mas infelizmente todo ser humano se encontra em constante evolução e uma consequência disso é a perda dessa proteção. O indivíduo vai para o mundo, e com isso, perde seu porto seguro. Podemos ver isso sendo retratado, ainda neste primeiro poema, quando lemos “A cada mudança, um pedaço diferente de mim ia na mala. Enquanto tentava me encontrar na casa mais nova, sozinha, desvendei uma criança que precisava gritar”.

A maturidade assim que nos atinge, vem feito avalanche. Claro que depois da tormenta aos poucos vamos nos reconstruindo, mas quem disse que esse processo seria tranquilo?! Arrumam-se as malas e se parte para um destino incerto, sempre desejando ter o afeto que antes possuíamos. Em Fuga, segundo poema do livro a autora retrata esse perder e se encontrar nas andanças da vida, sempre em busca daquele afago, que quando criança, tínhamos.

Quando lemos “vou fazer as minhas malas/ me desfazer das minhas amarras/ vou embora de mim/ para me dar um tempo”, percebemos a necessidade que cada indivíduo tem de procurar a si mesmo nesse vasto mundo, na constante tentativa de se encaixar nas vastas ondulações da vida, assim como a das estradas que caminhamos. Na constante busca por si, também está a constante procura daquele amor que ficou para trás.

Esse Amor (de poema de mesmo nome), talvez fraternal, por vezes encontra-se em “um pub em Londres/ uma cafeteria em Paris/ um show dos Los Hermanos/ a esquina da casa do seu mais novo melhor amigo”, talvez ainda diante d’ “o aeroporto vazio depois das onze/ a fila do mercado/ a mesa do bar no Rio Vermelho”, ou ainda, quem sabe, “em qualquer lugar/ a gente vai achar que é a hora errada/ e só vai se dar conta depois”.

E é nesses encontros e desencontros de nós mesmos que buscamos um afeto, aquele de quando criança, mas que agora se encontra em ruínas nas vagas lembranças de um passado vívido. A dor da partida e desse nosso encontro de nós mesmos é dolorosa, podendo ser visto no poema Partida, onde diz “bati a porta/ e esperei/ sua mão/ sua voz/ algum sinal/ de que você não deixaria/ eu ir”

Elizza Barreto por meio de sua obra Afeto em Ruínas (Editora Penalux, 2020), espera que o leitor se encontre, mas não só a si mesmo. Que encontre seus caminhos (sejam os do leitor ou da autora), e porque não dizer, encontre o afeto, como aquele carinho de um colo de mãe, sentindo, mesmo que seja só em lembranças, aquele cheirinho, daquele perfume, que só ela tem. Ah como é bom lembrar…

 

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