Roberta Tostes Daniel nasceu em 1981 no Rio de Janeiro (RJ), cidade onde reside. Seus poemas foram publicados em antologias, sites e revistas literárias no Brasil e em Portugal, tais como: Mallarmargens, Zunái, Musa Rara, Diversos Afins, Estrago, Incomunidade. Participou das antologias “Desvio para o Vermelho” (Centro Cultural São Paulo – Org. Marceli Andresa Becker), “Amar, verbo atemporal” (Ed. Rocco – Org. Celina Portocarrero), “História Íntima da Leitura” (Ed. Vagamundo – Org. Fabiana Turci) e Crônicas de um amor crônico (Ed. Penalux – Org. Moreno Pessoa e Priscila Rôde). Escreve no blog http://sedemfrenteaomar.wordpress.com.
Clareira
Tocamos no abandono. Repousados, como animais saciados, depois do abate, a existência de um devorando a do outro; o sangue sobre a cama, imaginário, testemunha da fertilidade e da morte. Tocamos na morte. Paira no cansaço, projeta o abraço. Abraçados, morremos. Como poema e como imagem. Há imagens que não se formam, despedaçam no sonho, que não cessa. Sonhamos, ausentes: homens que deitam para pensar o selvagem. Faltas, nas mãos, a cultura e o seio. O que não tocas, nomeio. Para tornar o que é(s): palavras abrindo como corpos, palavras dissecadas pelo amor. Suspensa à janela, invejo o vento: não precisa de razão. Por ela, a corrente de ar liberta-se, finda o dia; cede ao desejo de voo, infantil, mítico. Posso me jogar como uma criança, não morrerei. Posso me jogar, que morro sem temer. Meus pés não caminham, caminham pelo livro que lês. No silêncio, cortina de fumaça, chego ao teu lado. Entre o espelho e o outro, tua: desfiguração. Deitados pela tarde, como animais, sem fim nem início. Tocamos no infinito.
Ofídico
Naja alguma,
o veneno na cintura.
Mas estava sobre a cama
o próprio Butantan.
Quando deita na mulher
o réptil movimento
inocula um nome –
antídotos degredam.
Encouraça
o seio atingido.
A boca espreme
o anjo que a auréola reserva.
O amor custa a morrer.
Serpenteia no umbigo.
Muscular
Ter o coração a contrapelo
limado como uma pedra
depois do vento.
Inaugural como a forma
do acaso.
Franjado de líquidos
e cernes
vapor e tinturas
do sangue e do caminho.
Burilar esse pedaço
de tempo, onde meu corpo
deitou morada.
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