A poesia da vida, a vida dos mares, dos ventos, da existência em Velas ao vento | por Marcelo Frota

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Velas ao vento é um livro de sensações e memórias. E é uma delícia. É aquela baianidade da prosa do Jorge Amado, das canções hipnóticas do Caetano Veloso ou do inesquecível e imenso Dorival Caymmi. Caymmi esse que é citado na abertura do livro com um trecho de O Vento, e que nos leva a intuir o que vem pela frente. E conhecendo a poesia da Rita Queiroz, já ao abrir o livro, intuía, pulsava, sabia que viriam versos de elevada beleza. Beleza essa que só os baianos, e alguns cariocas, tem nas veias.

Confesso que pulei a introdução, como pulo todas as introduções, só as lendo no final do livro. Gosto da descoberta sem influência das palavras de outros. E descobri Rita, como um ser da natureza. Um ser de encantamento pela magia das águas, pelo belo das areias, das ondas, dos mares. Velas ao vento, para mim, é o não urbanismo, é a comunhão do ser com a vida, é transbordar e respirar longe do wifi e das redes sociais.
É um voltar a ser, na simplicidade do silêncio da solidão, acompanhado pela vida que nos cerca.

O encantamento, deste que nos fala, começa logo no início do livro, com uma ode as belezas do mar, que só aqueles que o tem como companheiros de vida podem lhe ofertar: “Mar de mistérios/Do sublime espetáculo/De pulsares e ninhadas de estrelas/Proeminentes no entardecer da chuva/E bailado das gaivotas”. Essa oferenda aos mistérios do mar me remeteu a Hemingway. Ao quanto o escritor americano era apaixonado por Cuba e seus mares de imensa beleza.  Lembrei de O velho e o mar, para mim, a obra máxima de Hemingway. Lembrei do mar, do velho Santiago, do menino Manolin, do sol, do céu e da luta com o espadarte.

A memória, mencionada logo no começo, se fez presente nas frases iniciais do poema Lembranças Inaudíveis: “No silêncio das manhãs/Semeio longínquas saudades,/Escovando as lágrimas outonais.” Confesso, lembrei de mim, senti os versos no amago do meu ser. Senti na noite a presença das minhas manhãs de silêncio, em que o vento do lado de fora se faz ouvir, os pássaros se fazem presentes, assim como carros e outros veículos motorizados. Desse silêncio de palavras, mas vivos em sons do ambiente, faço de mim o que sou. E acredito, muitos que podem ter para consigo mesmos esses momentos de silêncio, de contemplação do mundo sem palavras, se fazem seres que contemplam a vida, em um espaço e tempo de plenitude, espaço e tempo que transcende a compreensão daqueles que ignoram a simplicidade do silêncio.

A jornada por Velas ao vento, me levou a outras reflexões, outros momentos que guardarei para mim, mas, em mais uma confissão, senti que muitos dos versos “pareciam” escritos para mim. Sentimento esse que eu tinha na adolescência, ao pensar que muitas das letras do Renato Russo foram escritas para mim. Grandes poetas são como Renato e Rita, escrevem para todos, mas parecem escrever para um.

Um outro pensamento que me acompanhou: “Teria Hemingway gostado de Velas ao vento? ” Acredito que sim.

 

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Marcelo Frota é professor, escritor e poeta. Apaixonado por música, literatura e cinema. É coautor de Compilação Poética das Margens e autor de O Sul de Lugar Nenhum, lançado em 2019 pela Editora Penalux.

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This Article Has 1 Comment
  1. ALEILTON FONSECA Reply

    Excelente leitura desse livro encantador de Rita Queiroz. O resenhista demonstra que sabe ler poesia com espírito aberto e atento, pois capta bem as linhas de força do lirismo dos poemas, suas palavras e imagens, suas metáforas do mar, da água e da vida. Parabéns.

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