FA: Corpo pulsátil e linguagem parecem inventar a vida ou o movimento dela. Não é ideia de fragilidade ou sim, pois escrevemos para algum tipo de salvo conduto. Fale sobre isso.
MCP: Esse livro é organizado como uma pesquisa em torno de um pensar que vem do corpo, sobre perceber o que o corpo já nos diz mesmo quando(ou principalmente quando) tentamos abafar. Outro dia escutei o filósofo Bayo Akomolafe refletir ‘sobre se pensar como paisagem’, como parte desse todo.
Quando o corpo é parte, nós não estamos, por exemplo, reagindo diante de uma fumaça tóxica que respiramos neste exato momento em grande parte do brasil, nós somos parte dessa paisagem tóxica, nós nos confundimos com essa toxicidade. Essa percepção de nossos corpos como paisagem também nos ajuda a criar um senso de responsabilidade. Eu acho que esses esses eventos extremos cada vez mais nos mostram o quanto nós somos esse todo e a escrita é diante disso, uma possibilidade mágica, um jeito de inventar algo. A escrita também se faz necessária para marcar, organizar o movimento e acompanhar o corpo nas possibilidades.
FA: O movimento de uma queda pode não ser físico, a psicanálise lida com as pulsões de vida e morte, com o inconsciente transformado em linguagem. Estas flutuações de alma encontram-se no seu livro. Por quê?
MCP: A flutuação e a queda são parte de um mesmo movimento, só que na flutuação você está olhando para o céu e na queda para o chão. Podemos pensar também que a queda é o futuro da flutuação. Como diz o Ailton Krenak “Por que nos causa desconforto a sensação de estar caindo? A gente não fez outra coisa nos últimos tempos senão despencar. Cair, cair, cair. Então por que estamos grilados agora com a queda? Vamos aproveitar toda a nossa capacidade crítica e criativa para construir paraquedas coloridos”.
FA: Que poetas mais se aproximam de sua estética de escrever, cite quais e o porquê?
MCP: Adoro Adélia Prado, Sophia de Mello Breyner, Tamara Kamenszain e Matilde Campilho. Eu também sou muitíssimo influenciada pelas minhas colegas de escrita, das pessoas que em sua maioria conheci nas oficinas de poesia do Carlito Azevedo: Catarina Costa, Luisa Müller, Lolita Beretta, Isabela Otechar, Luiza Mussnich, Tite de Lamare, além do próprio Carlito. E também me sinto profundamente influenciada por autores que não são da poesia mas mas quede alguma forma abordam esse entrelaçamento das crises contemporâneas que a gente vive como Donna Haraway, o Bayo Akomolafe e a Eliane Brum.
FA: Há algo de cotidiano, de crônica nos seus poemas. Como se fosse um relato poético. Explane melhor.
MCP: Como fugir da vida que levamos? Como diz Adélia Prado, o que detona a vontade de escrever “é o próprio susto, o próprio espanto que eu tenho com a vida e a vida que eu tenho é a de todo mundo”. Colocar uma lupa nos acontecimentos, criar uma atenção para o que pode virar escrita, como uma forma de sair do automático, um exercício de percepção.
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