I
operação de rotina
vinte metros de casa
a barreira cada vez
mais perto
daqui a pouco
eles vão tá aqui dentro
pensa…
abre o sorriso
abre a mochila
abre a sacola
abre a marmita
revira o arroz
o feijão e a
bisteca frita
no outro compartimento
a carteira de cigarro
um isqueiro e a
escova de dentes
o militar joga
a mochila no chão
e ordena:
— Teu nome?
joão. joão da silva.
— Documento?
esqueci na obra, senhor.
e a criatura de farda
ri e diz
— Conta outra, neguinho
desse jeito você
não vai passar.
joão olha no relógio
o coração acelerado
suor frio escorrendo
no rosto cansado
mais alguns minutos
e ele chega atrasado
não tem como voltar
o patrão não vai perdoar
atrasar não de novo
eu sou trabalhador, senhor.
ontem mesmo passei aqui
com o senhor mesmo senhor.
e a coisa diz:
— Eu não te conheço.
e as armas gritam:
— Sem documento
ninguém vai passar
mas se quiser
você pode tentar…
II
ordens da casa
não são crianças
saindo da escola
são bandidos e
projetos de bandidos
revistem suas mochilas
vocês vão encontrar
drogas ou armas
vocês vão encontrar
entre os livros e cadernos
entre os lápis e canetas
alguma coisa de bandido
algum rastro de culpa
alguma coisa errada
tem que ter
sempre tem
bandido é bandido
não são trabalhadores
descendo o morro
são bandidos
projetos de bandidos
e ex-bandidos
por isso peçam os documentos
tirem fotos dos seus rostos
tirem fotos dos seus documentos
tirem mais fotos dos seus rostos
e tirem mais fotos dos seus documentos
procurem por tatuagens suspeitas
intimidem e ameacem
revistem as bolsas
as bocas os bolsos
as sacolas os sapatos
revistem tudo pois
são bandidos e eles sabem
esconder bem
disfarçar muito bem
sabem até chorar
quando é preciso
não acreditem
em suas histórias
em suas lágrimas de
crocodilo bandido
nem é gente
e aqui só tem isso:
bandido.
entenderam?
III
todo mundo quieto
enxurrada de balas
passando caçando
blindado comendo
pedra barro lixo
alimentando medo
no céu cinza paira
o pássaro de ferro
com seus olhos de fogo
prestes a arrancar
todas as telhas
pronto pra arrancar
o que for preciso
no colégio o
professor sussurra:
tudo mundo
quieto qualquer
movimento pode
ser fa…
Felipe Teodoro nasceu em 1993, em Ponta Grossa (PR). Publicou contos e poemas em antologias nacionais e nas revistas literárias Vacatussa e Gueto. Atualmente finaliza o material para o seu primeiro livro. Contato: felipets9@hotmail.com.
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