A grande caixa acústica, por Jean Narciso Bispo Moura

A grande caixa acústica, por Jean Narciso Bispo Moura

 

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Em meio aos ruídos urbanos, 2016, Fabiano Fernandes Garcez, Patuá.

 

 

Em Meio aos ruídos urbanos, o livro mais recente de Fabiano Fernandes Garcez é um ótimo exercício de percepção, de escuta social, uma comunicação poética apontando o agudo fosso existente e naturalizado pelas narrativas conservadoras de dicção político-econômica e social.

Fabiano, no seu livro, mostra o retrato da injustiça, sem maquiagem, põe na tela o estado e as condições a que alguns humanos são submetidos. Na sua tela as pessoas sedadas não exibem estranheza e nem perplexidade frente a miséria alheia, o mundo é por ele fotografado, o autor comunica-se com fina ironia no acessível pavimento da linguagem. A palavra retrata a condição do indivíduo em meios aos ruídos e a grande agitação da grande cidade, e a sua percepção de solidão em meio a inúmeras vozes e presenças humanas, igualmente pensativas em si mesmas.

O grande ponto a ser destacado é a percepção do autor que identifica os grandes impeditivos da escuta, pondo refletores nas exorbitantes distâncias materiais entre grandes afortunados e os que possuem quase nada, tendo a possibilidade de viver dignamente surrupiada.

O livro de Fabiano catalisa os movimentos polifônicos, os assombros, diante desse turbilhão da vida urbana e estabelece um ponto de convergência.

O poeta, em meio aos ruídos, desvencilha-se da confluência anestésica, recua-se para ampliar a própria acuidade: as buzinas dos carros, os sons dos cantores e artistas de rua e de seus aglomerados, os passos apressados dos camelôs com suas bancas pré-moldadas para fugas; são cenários constituintes da agitação da metrópole, que são decifrados nas suas capilaridades.

 

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No Ruídos urbanos, há flagrantes, nada escapa, até mesmo uma cena pericial e comum à atividade profissional da polícia científica é poeticamente capturada.

Nesta incursão pela urbe, ele cerca a realidade sem pôr lantejoulas ou muitas metáforas, a realidade ela como é; o poeta dá um passo adiante mostrando o fundo falso daquilo que vê.

Diante disso, desse conjunto de sons, Fabiano Garcez busca ver o som comum no emaranhado social, dizer que neste tumulto aparentemente sem sintonia, tem um bem orquestrado concerto.

Deste modo, o poeta vê a consciência coletiva em estado turvo. Os ruídos observados não são permissionários de nenhuma escuta crítica por parte da maioria da população oprimida; tudo é propositalmente dissonante. Ele registra um mundo ruidoso e a sua grande caixa acústica, deflagrador de uma desigual relação$social.

 

 

Jean Narciso Bispo Moura, poeta e autor de Retratos Imateriais  (Singularidade, 2017).  A sua primeira obra foi lançada em 2002.

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