privacidade
Porque aqui é São Paulo, estar perdido é o seu novo lar.
(Ricardo Terto)
nascer em são paulo
sempre é prematuro,
começo da ponta
de um peso, buraco
que não é túnel,
que chuva não
inunda, que cheiro
de café não
preenche, edifício,
fístula, santo:
quanto maior a pedra,
maior o câmbio, traste,
a vida em ricochete,
uma cadeira vazia na sala,
uma corda que pende
(e a cortina
do quarto
está sempre
fechada)
roupas no chão
(para Jamesson Buarque)
o pássaro voa até a janela.
saiu do meu ouvido,
mas as asas permanecem
batendo dentro da
cabeça.
(na luta
a luta
cansa.)
o peso é impossível e
há meses não sangro
como se deve,
pra fora.
– estou grávida
de abismo.
fluxo
de realidade nítida
há dias não acordo
tampouco durmo,
apenas observo:
há em mim alguma coisa
sem nome e excessiva
que torna a existência
impraticável, tanto pior
às duas da tarde
quando de fato são
duas da tarde
e a lucidez é tamanha
que desejar é a borda
do abismo, e sangra.
Lilian Sais é doutora em Letras, pesquisadora e escritora. Coeditora da Revista Libertinagem, de arte e literatura erótica, e uma das fundadoras da plataforma de ensino e difusão cultural Literartéria, lançará seu primeiro livro de poemas, “Acúmulo” (Ed. Patuá), durante a FLIP 2018, na Casa do Desejo, em Paraty, no dia 28 de julho às 19h.
belíssima estrutura poética com delicadeza e suspense. vou até adquirir o livro.