Livro de poemas Saltar Vazio reflete o mundo de um ser sem( re)visões extremadas
Por FERNANDO ANDRADE
Jornalista e crítico de literatura
Imagino um olhar nublado, assim como uma lente desfocada que não lê a imagem em sua perfeita semântica angular. Imagino os dias serem uma versão estrofada dos versos. À cada dia, seria seu correspondente ao verso. Para uma pessoa humana que cotidianiza sua vida, qual? efeito poético teria para ela um pedaço da sua vida, um poema de 30 dias. Como? ela se insere dentro deste contexto poético onde cada linha é uma ação em transcurso, onde requer movimento, empatia, soluções, ação propriamente dita. Para o poeta seu traço é derivadamente reflexão, não a imagem de um espelho, ou talvez sim, cabe um poema numa imagem refletida num vidro espelhado? Mas não podemos saltar para dentro do espelho, só Alice o pode para encontrar o coelho e outras criaturas do imaginário. Saltamos no vazio dos nossos dias, dos versos contados à minutos & segundos. Alguém já fez um haicai num fremi(to) de segundo?
O tempo parece ser o mestre de cerimônias do livro de poemas de Marcelo Adifa, em Saltar Vazio, Editora Penalux Repare, leitor, na ausência de definição de qualquer artigo+preposição antes do vazio. Vazio não cabe definições e um artigo e sua (pré)posição. Portanto o movimento que o poeta faz é de uma retratista, de um fotógrafo que usa uma lente subjetiva para filtrar luzes. Ou melhor sua opacidade, seus crepúsculos, uma forma de poente: aquela mistura de luz e negrume. Marcelo descreve uma rotina modorrenta de algum homem que não processa um atitude de tristeza, em seus contornos cotidianos, mas é alguém que está & não incluído no mundo. Em seus poemas tanto imagéticos quantos discursivos vemos o desenho de um ação perene que nunca é descrição, mas sim sugestão de uma espécie de lente baça opaca que filtra a imagem em nuançe captando dela seus duplos- sentidos, suas entrelinhas.
Engana-se quem não vê em seus personagens afeto ou até mesmo alegria. Não são personas que caem na inércia existencial de um Sartre combalido; na falta de sentido da vida. Marcelo realiza muito mais um tapeçaria dialética sobre o humor, sobre a forma nem otimista sobre os fatos e suas reflexões como também não apresenta pessimismo ou niilismo. Sua dualidade em ser um exímio intermediador entre antípodas, entre extremos, em buscar no conflito, uma dose exata de veneno anti-monotonia. Todos sabemos que a vida não é cor de rosa nem muito menos cinzenta como um turbilhão de nuvens agourentas.
Fernando Andrade, 50 anos, é jornalista, poeta, e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemoemetria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. lançou nesta ano o seu quarto livro de poemas, a perpetuação da espécie pela Editora Penalux.
Be the first to comment