não sei como se dá o acontecido
seu modo particular de interagir com o tempo
não compreendo sua lógica
imprevista, sem avisar, de pronto, se mostra
e lá está, o rosto
calmo
perfil, respirando profundamente
cantando baixinho, para si, a melodia indecifrável
tão contrário ao modo áspero
de se oferecer ao olhar, aparentado aos feitos urgentes
tudo se inscreve nas minhas retinas
com a amplidão das passagens de espreita, o tempo
do alargamento das plantas, do giro das estrelas
o esmaecer da brasa em direção ao sono que a espera
em breve (sei, porque sempre retorna)
sua boca inspira
e a partir daí o tempo se dilata, o gesto, muito lento
focaliza o instante exato, a inversão
do pequeno dia ensolarado e quente da palavra
ao contrapasso inverso, oscilação que se inclina
ao sentido marítimo, o sangradouro das ausências instáveis
quando a cor mais escura do pássaro tardio
descerra, azul, as janelas do silêncio
hoje
algo oco ressoa
sua fala
sussurra
gesto um ruído amarelo
ao mesmo tempo em que deito sobre a mão estendida
a cabeça
outra órbita repensa
a revolução
de um girassol
não é concebível, assim transparece
na janela do sonho, a pupila se distrai
e não se encolhe mais frente ao sol
feito um poema, avalanche, neve branca
sobre o corpo tremente
seus pés anunciam o sismo, visionários
a sibila o disse pelo gesto do braço
o riso extasiado nas flores da pele
enquanto o sol dos sonhos transpassa a pupila
um trovão liberta os nós, o esteio do arrebatamento
esse mar de luz, a jangada
o teu corpo de som ressoando em mim
um pulsar
um buraco branco desembocando quasares
nos recessos do sangue
exposto pelo fogo, pela brasa que toca meus lábios
e perdoa meus pecados
eu toco e canto, e os rios da terra navegam conosco
suas barcas de luz
transbordam plenas para o mar
MINI BIO
Domenico A. Coiro é músico, poeta. Mora em São Paulo.
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