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Se for para entrarmos entremos com o corpo todo e depressa. Leais à Terra e ao fragmento da Humanidade. Entremos sem recuos no instante terrestre.
Ai dor suprema.
Ai cor invisível. Indivisível.
Se for para entrarmos entremos com a unha toda e a tola magnitude de sermos estrangeiros. Espelhos, de dentro iniciamos:
— dividimos o escuro e separamos as águas.
Se for para entrarmos entremos com o corpo todo e depressa e usando a porta da frente.
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Encheram as mãos e as cabeças.
Cantaram as canções dos pássaros.
Brilharam.
Encheram espaços.
Perseguiram os mais fortes.
Distraíram os preguiçosos.
Sob as canções dos pássaros inventaram outras.
As mãos sanguinárias eram limpas.
Esperavam por alguém com olho infestado e uma alma branca
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Aragem
As folhas, insinuam a poesia do vento e na raça clandestina do universo: há uma boca que se abre para a matéria.
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Há uma sala pequena que leva ao voo a cabeça inclina-se devagar confronta o lado insano da parede na sala os móveis desarrumados tornam-se imóveis diante dos olhos e suas veias na estante, o tempo rói o dorso do osso Ai! Que vem a ser isto?
Os móveis mobilizaram suas energias para um ser tão pequeno e quase sem alma.
Sim, diga-se: petit ou minúsculo tanto faz.
Aqui nomes não alteram a combustão do solo.
A terrena condição, fusão da química e física ou electrões e a gravidade. Bem se vê: a verdadeira gravidade é a porta que canta com tons graves a aguda substância da existência. E quem aí está para ouvi-la?
Quem aí está para sentí-la? Os dedos se foram, a cabeça se foi, toda biologia se foi. Toda ciência se foi. Resta a “aicnêic”, cá por mim o inverso vale, se é que a isto podemos chamar de: conhecimento sistemático; pondo a coisa motora da metafísica abaixo.
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O corredor.
Haverá dentro dele uma grande corrida?
Ou cores ou corrimões ou coringas ou cordeiros ou cordas ou concordâncias?
A mão apressa-se para chegar entretanto não há destinos. A mão é solitária por natureza. E na sua solidão exerce o mundo. O mundo exerce nela a matéria da incompletude. Não é do escuro que a mão tem medo. A mão teme a cegueira da parede. A visão atómica da coisa branca.
A mão em eterna construção cai no tempo. O tempo em eterna construção cai na mão.
Hirondina Juliana Francisco Joshua (Maputo, Moçambique, 31 de Maio de 1987), mais conhecida
por Hirondina Joshua, é uma escritora moçambicana. Uma poeta de destaque na nova geração de
autores moçambicanos. É Membro da Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO).
Livros publicados
Obras individuais
2016. Os Ângulos da Casa. Prefácio Mia Couto. 1a. edição Moçambique, ed. Fundação Fernando Leite Couto.
2017. Os Ângulos da Casa. Prefácio Mia Couto. 2a. edição. Brasil, ed. Penalux.
Obras colectivas
2005. O Grasnar dos Corvos (Peça de Teatro). Co-autoria.
Antologias
2006. Esperança e Certeza I . Antologia. Moçambique, ed. Associação dos Escritores Moçambicanos, pp. 47-49.
2008. Esperança e Certeza II . Antologia. Moçambique, ed. Associação dos Escritores Moçambicanos, pp. 63-65.
2012. A Minha Maputo É… . Antologia. Moçambique, ed. Minerva, pp. 45.
2014. Alquimia Del Fuego. Antologia. Espanha, ed. Amargord Ediciones, pp. 481.
Projectos Literários
Criadora da coluna Exercícios da Retina ‒ literatura moçambicana; Os Dedos da Palanca ‒ literatura angolana e Letras do Atlântico ‒ literatura portuguesa e brasileira na plataforma cultural Mbenga Artes & Reflexões.
Colaboração em Revistas e Jornais
Dentre as quais destaca-se as revistas Caliban, TriploV, Courier des Afriques e Literatas.
Também colaborou com a revista Missanga, de Moçambique, e actualmente escreve para as revistas Pazes, Raízes, Por Dentro D'África, Ruído Manifesto, Conti Outra, Zunái (Brazil), Sermos Galiza, Palavra Comum (Galiza), Pessoa, Literatura & Fechadura, Mallarmagens. Tem participado em colóquios, tertúlia e debates sobre literatura, em 2019 participou da 8ª. edição do Festival Literário de Macau (The Script Road – Macau Literary Festival).
Prêmios
Menção extraordinária no Premio Mondiale di Poesia Nósside, 2014
Assim, na pureza das palavras justas no lugar onde estar; a lassidão do ritmo e a profundidade da alma.Eis a poesia pura. parabéns à autora!!!