“Quando a alma inquieta, longe adeja – Três poemas de Bruno Borin

 

 

Derrubada

Ah saudoso Jaguaribe, Rio de minha vida
Águas imaginárias em que nadei…
Águas em que correm a força de Tupã
O sangue do trovão sem tempestade!
 

Queria ver-te mais uma vez cirandando, 
Sem o progresso da civilização 
Arco e flecha sem rumo de morte
A pureza livre de um verso inocente!

 

Dançam nas cordas o hiato das eras
Yamandú catequizado reza o terço
Empurrando as nuvens do céu 
Para dar sol às tíbías Caapongas 
Botões de cura em tempos negros…

 

Mistérios da língua Tupi, caraguatá
Para quem sabe da chaga e do luto,
Mitos que morrem entre balas e anúncios 
Mata derrubada, Adeus Poti…
Iracema é morta!
Rubra cor pinta as margens
Do saudoso Jaguaribe…

 

 

Lucífugo

Que instigante simbiose esta!
Uma Orgânica sintonia funesta
Como se pela noite protegido,
Fosse, pelo fúlgido luar, ungido!

 

Ah frialdade vã da madrugada
São cativantes as meditações 
Oriundos dos mais inesperados
Torpores! Poéticas elucubrações!

 

Despido da lida arbitrária diurnal
Posso, adentrar-me no paço eternal
E nele dançar melodias excêntricas
Até me reconhecer nas doces métricas!

 

Adianta gritar a um Deus por sono;
Quando a alma inquieta, longe adeja
Afogar-se sem sonho como um colono,
Para não sonhar com o que se deseja?

 

Será medo meu de adormecer docemente
E lá, ao dobrar uma esquina bem inocente
Não ver mais traço deste povoado mundo?
Ou sou refém de uma tristeza tão sem fundo
Que não posso dormir com a alma chorando?

 

 

Afogamento

Mergulho
Nas funduras
Obscuras do meu ser
Para obter a mais pura luz

 

Singro as ondas
Revoltosas
Das emoções escondidas
Metade dívida
Metade treva
Muralha de espelhos
Postigo dos desejos

 

Como nuvens de fogo
No céu do meu delírio
A dor dos calendários
Confronta a lisura do papel
Beirando a lágrima do meu ser

 
Humana ideia de mim
Que sou só esboço
Barco bordado
No tear desconhecido…

 

Bruno Borin Boccia é advogado e poeta. Nascido em 1991, descobriu na poesia os múltiplos sentidos que a vida pode adquirir e no Direito  o caminho do conhecimento; fazendo da palavra não só mero ofício,  mas uma pátria inteira para desbravar, conquistar e principalmente, para se reinventar!  Tem 3 livros lançados: As Pinturas Malditas (2013, Scortecci), Queda Livre (2018, Darda) e, neste mês de setembro: Constelações com a Desconcertos Editora.

 

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This Article Has 1 Comment
  1. Ana Angélica Reply

    Amo a sua escrita. Amo cada poema…

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