ESPERANÇA… POESIA VIVA
Vem de repente
o brilho travesso
dessa canção de sol
que envolve a tudo,
transcendendo esquinas
de medos antigos
– sem exigências
ou salvo-condutos –;
escancarando portas
como faz o vento;
sobre linhas tortas
como quer o verso;
e na paz da retina
arde peito a dentro,
sempre irresistível…
Vem inconsequente
alheia ao perigo,
essa monção de sal
a espalhar indultos;
transbordando rimas,
violando abrigos
– entre as luas cheias
de meus sonhos puros –;
repintando as rosas
até tanger o verde;
revertendo as horas
até exaurir o tarde;
e por ser menina
(alegre e ingênua)
banha-me de unguentos
contra o impossível…
FUGINDO NUMA TELA DE VAN GOGH
Cansado das vãs teorias,
busco a letargia
dos alienados felizes.
Não quero saber da política,
viro as costas ao frio
e à hipocrisia.
Entrego-me à incoerência…
só vou ouvir os pássaros
e apreciar as orquídeas!
Chega de tantas mentiras,
da esperança perdida
da pesada leitura.
Fico à margem dos dias,
da falsa engrenagem
das tristes notícias.
Cedo-me à ignorância…
só vou ouvir os pássaros
e apreciar as orquídeas!
Farto das ideologias,
dos beijos de Judas,
das falas prolixas.
Renego as tramas noturnas,
as turvas matizes
e as falácias da vida.
Rendo-me à intolerância…
só vou ouvir os pássaros
e apreciar as orquídeas!
LATINAMÉRICA
De tempos em tempos
surge furiosa essa loucura,
como um cão, babando de raiva
criado na casa grande
para morder o povo da senzala
e perpetuar a escravidão.
De vez em quando vem
uma carência insana de viver com medo,
tal alguém nascido entre feras
que tende a ter o coração mais bruto
e a idolatrar o erro e o injusto,
negando a cor e a flor… à primavera.
Aqui, não raramente tem
essa amnésia apagando a história
na cantilena ímpar da histeria
clamando o mal, sem que haja remorsos
numa vontade tosca de contar os mortos,
em meio às ruas sujas, sem poesia.
De tempos em tempos,
por vis boatos e falsos alarmes,
alguém coloca irmão contra irmão
– ambos, sem esperança ou horizonte.
Nesses dias, então…
a mentira funde-se à verdade
e a gente corre, cego de agonia,
atrás do nada, sem saber pra onde.
ANDRÉ LUÍS SOARES – Brasiliense nascido em 1964, nos anos 80 estudou Economia pela Universidade Católica. Em 2011 lançou ‘Gritos Verticais’, vencedor do Prêmio Cláudio de Sousa de poesia (Petrópolis-RJ). Em 2012 sua crônica ‘O Universo Vivo das Palavras’ venceu o XVIII Concurso Gaya Rasia (Porto Alegre-RS). Em 2013 seu livro ‘Os Irmãos Malês’ venceu o Prêmio Nacional Novelas Históricas da Bahia (Salvador-BA). Em 2014 seu poema ‘Círculo Vicioso’ venceu o IV Concurso Aparecido Roberto Tonellotti. Em 2015 seu romance ‘Sobre As Vitórias Que a História Não Conta’ foi um dos vencedores do I Prêmio Literário Nacional Oliveira Silveira, promovido pelo MinC/Fundação Cultural Palmares. Em 2017, a convite da editora Malê, foi um dos palestrantes da Feira Literária Internacional de Paraty (FLIP). Em 2018 seu conto ‘Enxadristas’ venceu o FEMUP (Paranavaí-PR).
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